Fotografia

Hoje, agora há pouco, uma foto roubou-me as palavras. Eu já estive lá, naquela foto, uma menina ainda criança que acreditava em tudo, até no mundo. Era uma menina criança que, ainda tão sentida, sorria para aquela câmera. O tempo, como um gole feroz de realidade, passou. Passou sem que soubesse que havia passado, passou ainda compassado. E nos compassos, ainda que em acordes repetidos, descobri que harmonia não pode ser assim, sozinha. Como estaria ali, naquela foto, se, em verdade, estava só? Aliás, sozinha nunca estive. E foi naquela foto, que já não me continha, que me reconheci por poesia. Aquela menina, que tanto fazia, hoje já não mais o faz. Hoje, ela a vê por detrás da tela, numa moldura que é só dela.

Nos segundos em que a imagem roubou-me as palavras, vi que 6 meses separavam-me de um outro "eu". De um "eu" que, Deus me perdoe, morreu. Um "eu" que só há de existir em fotos que o tempo encarregou-se de apagar. E, tão maior do que um dia fui, não desejei estar ali. Já não importava. E foi que escrevi, com o coração entre palavras já ditas, que, como que em tantas outras fotografias, agora ria, nas fotos que eram só minhas.

Fernanda Marinho Antunes
Enviado por Fernanda Marinho Antunes em 17/07/2016
Código do texto: T5700561
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.