A estória de Dedel

Dedel foi um famoso jogador de várzea - goleiro - no Acre, nos anos de 1920. Dizem os mais velhos que ele era destemido em pegar qualquer chute que se aproximasse de sua meta. Não importando a distância do petardo.

Assim, derrubou técnicos e atacantes de grande habilidade ao longo dos anos. Sempre com a sua habitual técnica em catar chutes aos montes.

Reza a lenda que certa vez, num dificílimo jogo que, até aquela momento, estava em 0 x 0, o atacante adversário driblou Dedel na entrada da área e se preparava para dar o chute quando o arqueiro, desesperado, sem poder chegar a tempo, desamarrou uma das chuteiras e jogou-a em direção à bola, que caprichosamente desviou a sua trajetória para a linha de fundo.

Dessa forma, Dedel passou 27 anos sem sofrer gol. Não havia meios de seu querido Taquari, clube o qual defendeu por toda a carreira, ser derrotado. No entanto, já aos 43 anos, eis que o fato aconteceu.

Estava marcado para um domingo a final entre Taquari e Ipase, o clássico de grande rivalidade no Estado. Apesar de não tomar gols, Dedel sofria por atuar em um clube que também não os fazia. Com empates eternos, o Taquari estava há mais de 15 anos sem um título. Aquela era então, a oportunidade para que tudo mudasse.

O time estava confiante, contava com o artilheiro do campeonato e, claro, o ídolo máximo da várzea. Além disso, jogava pelo empate, por causa da grande campanha na primeira fase.

O jogo começou sob uma chuva de fogos e rojões. Após um primeiro tempo duríssimo, os times voltaram confiantes em suas forças. Já no fim, após grande lance do Ipase, o atacante fora derrubado na área do Taquari.

A torcida estava aos berros. Faltando poucos segundos para o término da partida, e com um goleiro imune aos gols, a torcida do Taquari já soltava o grito de campeão.

O atacante colocou as mãos na cintura, olhou demoradamente para a meta de Dedel, apontou a canto esquerdo e chutou, lá mesmo. O lance foi rápido, mas muito longo na cabeça dos que estavam presentes. Dedel saltou como sempre, e já ia chegando na bola, quando esta quicou no gramado, bem a sua frente, e o encobriu. Rápido como era, pulou em sua direção, mas não, aquela hora fora diferente.

Depois de 27 anos, Dedel sofreu um gol. Um inútil e triste pênalti que entrou de manso, no ângulo do goleiro. Aquela bola foi longe, longe pra Dedel, que estava caído no gramado, perplexo e triste, enquanto o Ipase comemorava o título.

Após o ocorrido, todo mundo, quando queria se referir a algo intenso, usava o nome de Dedel. Longe pra Dedel, ruim pra Dedel, triste pra Dedel.

O goleiro, aposentado e malancólico, partiu em direção à Amazonia, vivendo a navegar num pequeno barco. Dizem que às vezes, é possível avistá-lo nas águas do rio, navegando longe, sempre longe, até mesmo pra Dedel.