MEDALHA DE PRATA (Inspirado na derrota das meninas do vôlei do Brasil pra Cuba)

A medalha de prata não nos traz a conformidade da derrota, porém não nos dá a felicidade da vitória. Não contempla o sucesso , mas não nos condena ao fracasso. O tipo de derrota do segundo lugar, é completamente diferente ao tipo de derrota do terceiro lugar!

Se a “Prata” é o primeiro dos últimos, o “Bronze” significa que somos o “segundo” dos últimos. Ou seja, até na competição dos derrotados, não somos vencedores, somos derrotados pelos “derrotados”. Entenderam o trocadilho??

O terceiro lugar nos traz a certeza absoluta de que somos pessoas comuns, atletas comuns, seres humanos dotados da natureza comum. Pessoas que, apesar de sermos especiais e únicos na criação, não temos nenhum atributo humano diferente dos outros. A certeza mais honesta que nos vem, é a de que tem gente muito melhor que a gente no oficio que a gente faz!

Já o segundo lugar, vem aquela sensação do quase lá...:

__Puxa, falta pouco pra eu chegar lá!! Quem sabe,... eu aumentando mais horas de treino e empenho... quem sabe na próxima, não seja a minha vez!!!

Então, mediante esta constatação, a sabedoria popular diz aos medalhistas de bronze o seguinte:

“Relaxe e goze!”,

Comemore a sua “não-façanha!”

A não-façanha de ter sido apenas o terceiro lugar.

“Olhe pra baixo, tem muita gente pior que você!”

“O mundo é uma escada, você está sempre no meio.”

“Tem muita gente sonhando com o seu terceiro lugar.”

OBS: __Quanto esta frase, não há mentira mais descabida. Nunca conheci ninguém que sonhe ser o 3º lugar de alguma coisa! Você conhece?

“Não tenho tudo que amo, mais amo tudo que tenho!”...

“Alegre-se com as pequenas vitórias do cotidiano!”...

Então a medalha de bronze nos motiva ao comodismo. São frases como essas, ditas acima, que não permitem a nossa alma ser dominada pela tristeza, porém falseiam com a razão, evitam a nossa consciência de “amargar” a realidade da derrota, azeda e morna.

Esses ditos populares são verdades simples, ou melhor, “mentiras essenciais” da nossa vida. Existem, única e exclusivamente, para colorir o preto e branco sem graça da nossa “não-vitória”.

Essas idéias, que nos acomodam a derrota, trazem uma satisfação secundária(diriam os psicólogos) bem própria aos doentes que não querem a cura. Pra alguns a cura da doença é a pior coisa que poderia lhes acontecer. Justamente porque a doença é a única arma de sedução dessas pessoas para obtenção de atenção, carinho.

E mais, este prazer indireto, formam grupos de solidariedade que não se cansam de ouvir as mesmas histórias, as nossas desculpas. Fazem o público projetar sobre o atleta: não um holograma cinematográfico, não um projetor que com sua lente, lança luz no telão! Não um projetor que feito uma mão, aquarela e pincel pinta imagens em movimento emocionando a todos...a idéia da acomodação faz a poppulação projetar sobre os atletas: não as luzes da admiração, não as luzes das estrelas num céu de verão onde a lua vem e faz morada, não as luzes da ribalta...

Mas a idéia do comodismo, projeta sim: os faróis da misericórdia, as lamparinas na escuridão da autocomiseração, reúnem os beatos da mediocridade numa procissão sem fim, caminhando vida a fora...deflagram doenças emocionais escondidas em todos nós, nesse mar coletivo formado de almas humanas, é daí que vem as expressões do ciúme, da revolta, da inveja sobre alguns que tenham um olho miope na terra dos cegos...

Então, mediante ao terceiro lugar, os torcedores projetam este tipo de sentimento aí, este sentimento comum latente no coração de todos nós.

Antes de continuar esta crônica, gostaria de fazer uma pequena digressão:

Todos nós experimentamos “Vitórias” e “Derrotas”. Diante da derrota, o que advém daí é um sentimento estranho, uma espécie de “pena” comunitária!! É a mistura de autocomiseração e a misericórdia não-excludentes numa mesma via, é um sentimento de pena que parte de si mesmo, indo em direção a dois alvos distintos: a si mesmo e ao outro.

Uma populacão que carece de bons exemplos como a brasileira, mediante a uma derrota dramática feito as meninas do vôlei esta semana nos deixa chateados.

Nosso conforto é que a "medalha de bronze", diferentemente da "Medalha de Prata"(foi o que as meninas ganharam) apresentam alguns sintomas complicados no diagnóstico do espírito público:

1º _ Dentro da população torcedora, cada um individualmente, reúne seus insucessos, recolhe suas mazelas, cata suas feiúras, ajunta seus complexos como se fossem paus e pedras e todos concomitantemente transformam a derrota de uma competição num linchamento emocional onde as pedradas e a pauladas são feitos de silêncio! É um linchamento onde não há Judas. Praticamente uma catarse.

Ou seja, a torcida projeta não para os atleras, mas para a derrota... todo esse lixo emocional, todo esse lixo particular que cada um trás na sua história de vida. De tal modo que, o evento da derrota transforma-se num "lixão emocinal". Todo Lixo humano que é ressentimento, recalque, ira e etc... e são experimentados por todos nós, precisam ser reciclados, transformados em energia produtiva novamente...neste sentido as olimpíadas e Pan Americanos, as competições esportivas de um modo geral exercem essa função.(reciclar o lixo emocional em energia positiva, boa a proveitável)

Estamos tristes, as meninas do vôlei perderam a final do campeonato para suas principais rivais: Cuba.

Essa perda da medalha de ouro foi como que as atletas tivessem o poder de fazer latejar as derrotas de cada um de nós brasileiros.

Ao contrário do que muita gente pensa, as derrotas são estradas não apenas de uma via de mão única... mas sim, via de mão dupla. A dor da derrota de nossas atletas desencadiaram a dor da derrota de todos nós. Tanto quanto a euforia e alegria da vitória de um atleta na natação por exemplo, contagia a vitória singular de cada um de nós.

Nesse sentido o esporte é emblemático, é paradigmático pras sociedades pós-modernas.

E mais ainda, na tecnologia de informação dos sentimentos, a transmissão de energias humanas em forma de emoções coletivas, não são absolutamente em nada parecido com a tecnologia utilizada nas transmissões de Tvs, onde uma única estação de Televisaõ apenas, transmite suas informações para o mundo, onde apenas um ponto emissor sub-julga a todos outros pontos como simples recptores...

A tecnologia da informação dos sentimentos, na transmissão de energias humanas em forma de emoções coletivas, assemelham-se muito mais aos paradigmas da internet, onde todos os pontos se comunicam, interagem entre si, provocam à todos os outros pontos concomitantemente.

Posto isto,

Voltemos à medalha de bronze...

Porque que eu disse tudo isso? Porque eu fiz essa viagem enorme?

Ora, para de alguma maneira, demonstrar que a dor de um atleta-bronze não é apenas e tão somente sua dor pessoal. Mas os gemidos particulares de todos os outros que torcem por ele, nesse sentido há uma descarga enorme de emoção sendo despejada ali....

É como que se a ferida de cada pessoa, a começar pelo atleta, fosse despejada no mesmo ponto de contato, como se a dor coletiva do “corpo social” de uma nação, a dor coletiva de “toda população” de um país, fosse sentida naquele atleta.

Para me explicar melhor, imaginem a nação como um corpo. Imaginem o atleta naquele momento, na hora da perda da competição, esse atleta fosse uma espécie de “furúnculo” desse corpo. Um “furúnculo” que arde e dói roubando dele balbuciados e gemidos, como se ali fosse depositado o pus psíquico de todos nós, uma infecção localizada, onde ali tivesse corpos estranhos e anti-corpos brigando entre si...

__Ah coitado!... Ele é tão bonitinho, tão bonzinho, pena que é bronze, esse esporte não é pra ele...

Essa dor coletiva, é um sentimento comunitário, solidário onde todos se condoem com a nossa dor...

Resumindo,

As frases que confortam a derrota no bronze, são miragens que nos enchem de fé, esperanças e força pra gente caminhar na solidão do deserto em busca do “oásis” da perfeição!!!

Então, se de um lado o “segundo lugar” não nos dá o conformismo do “terceiro lugar”, de um outro lado a “Medalha de Prata” também não nos dá o grito de campeão!

A “Medalha de Prata”, não traz o conforto, a paz interior do dever cumprido, a certeza de ter atingido o objetivo, o brinde da comemoração, a conquista, a sensação de sorte, a sensação de estar fazendo parte de uma conspiração universal_ uma conspiração cósmica que concorreu pra que ele fosse o homem da façanha...

A "Medalha de Prata” não nos dá competência do primeiro lugar, não nos presenteia com os tapinhas nas costas, os aplausos e honrarias, não trás a enxurrada de jornalistas buscando uma declaração do campeão, não capta o patrocínio necessário pra continuar os treinos da próxima temporada. O segundo lugar nos alegra, porém uma alegria que não é carnaval nem revellion!!!

A “Medalha de Prata” não faz você subir no lugar mais alto do podium, não faz o hino do seu país ser tocado para o mundo inteiro reverenciar.

__ Quando subimos ao podium e somos revestidos de uma "Medalha de Prata", a sensação existencial-emocional é aquela voz que vem da consciência e grita aos nossos ouvidos:

__Puxa, poderia ter ganho o 1º lugar!

No pódium sob aplausos da torcida temos que ser políticos, demonstrar que aprendemos a maior lição que um cidadão pode aprender. Lição que todo o cidadão deve aprender, é essencial ao desenvolvimento do seu caráter é justamente lugar comum:

“aprender a perder”...

Sem a derrota não há crescimento, sem a "Medalha de Prata" de vez em quando no peito da gente, nos tornamos vaidosos, egocêntricos, nos sentimos deuses de um reinado de mentira. Uma "Medalha de Prata" é essencial na formação do cidadão, do atleta e da nação...

Viva a medalha de Prata.

FlavioFerr
Enviado por FlavioFerr em 20/07/2007
Reeditado em 21/07/2007
Código do texto: T573033