Dois caminhos

(Em memória de minha querida esposa Luzia Helena Correia Prata)

No começo, em meu caminho, eu vinha só. Trazia na cabeça a esperança e os sonhos próprios da juventude. O caminho me parecia longo e apesar de percorrê-lo sozinho, não me sentia só. Sabia que no decorrer da jornada outros caminhos se cruzariam com o meu e, certamente, alguém haveria de aparecer. Assim, a profecia se cumpriu. Após uma longa curva, com trechos pedregosos e difíceis, nossos caminhos se encontraram. Ela chegou à minha vida como um turbilhão e mudou tudo: Surgiram as certezas e as incertezas, a segurança e a insegurança, os espinhos e as flores, muitas flores... Então meu caminho suavizou e a jornada se tornou prazerosa. O amor inundou nossos corações. Foram quarenta e oito anos de alegria, companheirismo, muito amor e até cumplicidade. Todavia, nada dura para sempre. Era um dia festivo, de alegre conversar. Estávamos entre pessoas queridas e ela brincava e sorria como uma criança, sentada ao meu lado, como sempre. Em um segundo vi meu mundo desabar, quando ela pôs a mão em minha perna, me olhou e disse duas palavras, apenas duas palavras de uma frase incompleta:

- Bem, eu...

Seu rosto tinha uma expressão de surpresa que ficará para sempre em minha memória. Naquele momento eu perdi o chão. Senti-me despencando em um abismo sem fim. Sensação que durou apenas um segundo, pois compreendi que ela precisava de minha ajuda, então uma serenidade imensa tomou conta de mim e eu fiz tudo que podia tentando trazê-la de volta. Foi em vão! Ela tinha partido.

Hoje, apesar das tantas manifestações de carinho, sinto que estou só. Meu caminho se tornou sombrio e tortuoso. Perdi o chão. Dizem que o homem, como o esteio, é a estrutura da casa. Não é! De que vale o esteio sem o chão que lhe dá toda firmeza? A dureza do golpe me fez perder a fé e a lucidez me impede de crer em um reencontro. Talvez, por isso, meu sofrimento seja maior e possa até durar mais. Prefiro assim a viver a ilusão de um falso conforto. Se assim é o meu caminho serei forte e transporei esse vale de lágrimas sem jamais deixar de reverenciar sua memória. Apesar da pouca estatura, ela foi uma grande mulher. Exemplo de mãe, esposa e amante. Um grande amor, ainda que não transcenda a eternidade, por certo há de durar enquanto eu tiver vida.