"The Passenger" e a falacia do pensamento impróprio

A alguns dias atrás fui pego de surpresa, em um dia comum, estava tudo bem normal e ridículo como de costume. Acordei com uma forte dor de cabeça, mesmo assim levantei, tomei café frio e escovei os dentes olhando para o idiota do reflexo.

Me puis a escrever para um trabalho do mundo acadêmico, o interminável academicismo, com cara de frustração mútua. Fiquei ali sem almoçar e me sentindo um nada que escrevia história frouxa. E escrevia bastante, bastante asneira, cheia de subjetividade e coisas que saem de mim para serem julgadas por outro ser e suas coisas. Redigi sobre um mundo diferente e seus embaralhos num contexto pós moderno que não se encaixa em nada, e assim ninguém se encaixa nele também. "Pós-modernismo não é o que você pensa" um apanhado de conclusões sobre os precipícios sociais, algo sufocante para as intempéries do que é, e o que não é real, e reflexivo para um adentro social da vida de um desajustado que não entende o corpo.

Escrevendo e pausando por pausar, fui coagulando questionamentos: Bem, talvez eu seja pós-moderno? Ou talvez eu seja moderno? Ou quem sabe eu não seja nada? Nem pensava muito sobre minhas concepções na sociedade, eu estava preocupado com alguns problemas que perturbam todos. Como os engajamentos de uma vida cotidiana nas cidades do interior paulista, aceitação inócua de capacitações temporais, ultrapassagem de conturbações sobre complicações juvenis, não cair ao atravessar a rua... Esse tipo de coisa.

Assim eu escrevi até me cansar, mas sem conseguir chegar a um fim. Entregaria o trabalho mesmo assim.

Arrumei a mochila, com indiferença e sempre com aquela sensação de estar esquecendo algo. Tomei um banho torto de tanto não estar embaixo d'Água. Esperei alguns minutos até tomar o ônibus. Me sentei sem pressa, colocando minha mochila entre as pernas debaixo da poltrona, então comecei a ouvir as musicas que separo na biblioteca do meu celular. me perdi no assento, no amontoado de sono e notas musicais. Joy Division; Raul Seixas. Enfim o ônibus chegou até a faculdade. Gal Costa; Os Mutantes; The Smiths. Sai da condução como se não tivesse estado lá. Jimi Hendrix; Gilberto Gil; Television. Caminhei até o portão e entrei na faculdade, desci a rampa, e andei até as escadas que dão de frente a sala de aula. Titãs; Howlin' Wolf; Pixies. Ao entrar na sala dei de cara com as pessoas que já via desde o começo desse ciclo acadêmico, nada de diferente, semanas e meses de igualdade, vestidos de diferentes formas, ouvindo diferentes musicas, conversando sobre coisas que mudam e etc... Me sentei no fundo como de costume sem tirar o fone de ouvido. Estava ali parado olhado pra mim, quando começou a tocar um som peculiar de um agente musical peculiar. Era então a música "The Passenger", uma música que tem tudo mesmo sem ser complexa, e que naquele momento se maximizou. A bateria rítmica, o baixo sobreposto e guitarra em composição base, gritavam na minha cabeça pra que eu retornasse a pensar nos valores do indivíduo pós moderno, não tive noção do que estava acontecendo, fui esfaqueado pela canção e realmente (metaforicamente), cai em um poço, um verdadeiro buraco de onde a geração da qual fui parido me afogou, consagrando minha fragilidade pelas mãos formosas de Iggy Pop. Todos ali naquela sala eram "iggy pops" a sua maneira, fazendo seus respectivos afazeres, juntos no mesmo ambiente. Uns dormindo, outros comendo, outros existindo. Eu estava lá também, pensando em coisas grandes e pequenas, vendo fogo queimar o quadro negro na fluidez dos burburinhos em classe ouvindo na música de exatos 4:44 minutos um verdadeiro gotejo de desorientação. Isso de longe foi a melhor face da pós-modernidade em toda minha auto, micro e macro, rasa reflexão, tudo desenhado no meu comportamento desligado. Talvez ali eu fosse o mais pós-moderno, ou talvez o menos, ou quem sabe não fosse nada.

Desse "questionamento" veio minha surpresa. Tudo aquilo já foi dito e já foi feito, tudo aquilo era transição, fixação e apropriação temporal histórica, famigeradas discussões que transcendem a existência, mas que no fim, discursam sobre aglomerações de um conhecimento que se consolida pelo simpósio de um todo de captação metafisica na liquidez do sentimento de ser e estar entre o individual e o coletivo... Me perdi nessa loucura, composta pela audição de uma faixa simples do disco "Lust For Life" e também, não menos "importante", na leitura superficial de um livro que nunca me interessou.

João PS
Enviado por João PS em 07/09/2016
Reeditado em 15/12/2016
Código do texto: T5752843
Classificação de conteúdo: seguro