Sorrisos postiços

Centro da cidade, do lado do terminal central. Uma bancazinha na saída do terminal. Um senhor de sorriso fácil vende picolés e o tradicional Triângulo da Sorte, prêmio da loteria que corre aos domingos. Havia combinado uma carona com um conhecido. Encostei-me ao lado da banca.

Todos que passavam por aquele senhor o cumprimentavam. Devia ser conhecido por ali. Não era para menos, contou-me que estava naquele mesmo ponto há 18 anos. Tinha como companhia a mulher. O filho falecerá ainda criança. Não deveria ganhar muito naquela ocupação, analisei. O mínimo para sobreviver, na verdade. Era flamengo. Sorria ao contar que viu Zico jogar no Maracanã, e como jogava o cidadão. Falta perto da área era gol dele. Sorria ao dizer que o mengão iria ser campeão este ano. Do contrário seria só se a arbitragem atrapalhasse. Aos que paravam para prosear apresentava sempre o mesmo sorriso. Se o conteúdo da fala fosse a família que havia deixado em Goiás há muitos anos, ria. Se a conversa com algum conhecido enveredasse para política fazia piada e sorria do mesmo modo. Se vinha alguém ressentido ou amargurado pela perda do emprego ou de alguém, confortava o infeliz com tal sorriso. Sorria. Sorria um sorriso ao mesmo tento meio banguela e alegre.

Havia algo ali que me incomodava. Não sabia se era a espera pela carona que já tinha meia hora de atraso, se era o ir e vir frenético de pessoas com sacolas na mão e olhar desviado para o chão ou para o celular, se era o grito dos camelôs ou se era aquele sorriso sem pretensão. Fixei-me no sorriso. Zombeteiro, ria de tudo e de todos. Senti uma ponta de raiva, por que não eu a sorrir assim? Parecia e era um sorriso desinteressado, sem vaidade, doado, não forçado. Espontâneo. Qual era, no fundo, a força motriz daquele sorriso? Qual é o motivo que me impede de sorrir também? Será que meus sorrisos são todos forçados quando os emito? Será que meus sorrisos sempre têm alguma conotação além do sorriso? Será que minha alegria não quer ser um grito de desespero? Será que meus sorrisos são para pessoas que não quero sorrir? Será que meus sorrisos são apenas falsos retratos para atestar aos outros que estou pretensamente feliz? Será que os sorrisos dos outros também possuem essas finalidades? Somos plenamente infelizes?