Um Dia de Cada Vez

A que ponto você foi chegar; sem joias nem anéis. Apenas bijuterias feitas em casa, de plástico barato. E cuida-se como pode; faz as próprias unhas e o cabelo. Os sapatos se acabaram. E quem vai pagar a pintura nova das paredes que começam a soltar cascas. Veja o que o mundo fez a você. Já não há mais esperanças em seus olhos e eles percorrem o chão por onde você passa. Não há mais como confiar em ninguém, porque todos querem tirar alguma vantagem de você. E os planos de se casar? De formar uma família bonita e ter um marido que a ame (e que ele nunca saiba do seu passado). Está tudo enterrado. Todo caminho parece ser a beira de um precipício. Algum amigo idiota poderia dizer “Poderia ser muito pior...” numa tentativa imbecil de reduzir seu sofrimento através da comparação com um sofrimento maior. Mais uma que acreditou que o caminho do estrelato era simples e fácil, apenas uma questão de estar no lugar certo, na hora certa. Acreditou em mentiras demais e agora sofre. Sofre em silêncio, quase não aparenta. Mas sua pele está gritando por um lugar para dormir sem preocupações. Não uma casa, mas um lar. Um lugar calmo, com uma música ambiente e uma garrafa de vinho pra depois do jantar. Mas são ilusões. Os cães estão latindo na vizinhança, mas isso não vai sair nas fotos. E esse dinheiro não vai pagar nem um terço das suas dívidas. Melhor nem pensar em quais serão os próximos passos dessa estrela da decadência, dessa primeira dama dos mendigos, dessa mulher de sonhos destruídos, sem esperanças, sem desejos, e agora já sem orgulho. Naquelas horas em que você sai do seu corpo e nem olha pra trás, você desmaia, viaja para outro mundo, e pode-se ver um leve sorriso no canto de sua boca. Mas algo a puxa de dentro destes sonhos infantis e quando você desperta com seus joelhos ardendo e o cheiro de mofo do carpete, o primeiro pensamento que lhe vem é entrar na banheira e cortar os pulsos, mas uma chama não quer se apagar. Você se levanta, se recompõe como pode e coloca uma chaleira no fogo. Um dia de cada vez...