A Reforma do ensino médio: Um conservadorismo perigoso

É com preocupação que tenho acompanhado o noticiário acerca da ‘’flexibilização’’ do currículo escolar anunciado pelo Ministro da Educação, Mendonça Filho, definido por ele como um”pacote” de “reformas” do Ensino Médio. Vale lembrar que o ministro recebeu Alexandre Frota em seu gabinete quando o ator apresentou suas propostas para a educação. Lembra?

A senhor ministro, aliás, não tem qualquer formação na área de educação. Político de carreira, formado em administração de empresas, Mendonça afirma que “O formato do ensino médio é do século passado”, em entrevista ao jornal Gazeta online (ver aqui

http://www.gazetaonline.com.br/_conteudo/2016/09/noticias/cidades/3976549-o-formato-do-ensino-medio-e-do-seculo-passado–diz-ministro-da-educacao.html).

Ironicamente, dias antes anuncia retorno da disciplina de Educação Moral e Cívica (ver aqui http://www.correiodobrasil.com.br/ministro-anuncia-reforma-do-ensino-medio-e-fim-de-varias-disciplinas/)

A proposta, portanto, parece objetivar uma retomada ao modelo de currículo adotado durante a ditadura militar, quando a disciplina era pensada para sustentar valores do regime anti-democrático e violento, escamoteado no discurso do civismo e do ‘’amor à pátria’’ de um governo cujo lema era “Brasil, ame-o ou deixe-o”. O mesmo ainda acabou com disciplinas como História, Sociologia e Filosofia, que agora serão “diluídas” e passarão a integrar a área de conhecimento “Ciências Humanas”, sendo optativas.

O argumento central é a reforma curricular, na qual português e matemática serão as únicas disciplinas obrigatórias. Embora muito importantes à formação discente, o exclusivismo das mesmas nega aos estudantes o direito de uma formação integral do cidadão-aluno, postulado pela constituição de 1988 e assegurada pela LDB 9394/ 96, fazendo da medida uma agressão frontal a esses pétreos regimentos, o que demonstra que os direitos constitucionais são ‘’elegíveis’’ pelo governo da vez e não necessariamente genuínos e invioláveis, como deveriam.

A proposta de reforma curricular do Ensino Médio não é nova, e ganhou força a partir do projeto ‘’Escola sem partido’’, que prevê que o professor em sala não tenha autonomia para discutir política, ou assuntos como sexualidade, gênero, diversidade religiosa e temas afins. O documento estabelece um binarismo nas relações docentes-discentes, em que haveria um professor-doutrinador ante o alunado que, tomado como desprovido de raciocínio próprio, estaria vulnerável a absorver passiva e compulsoriamente seus posicionamentos.

Esse projeto, ele sim doutrinador, de um conservadorismo canhestro e temerário foi, assim como a proposta aqui em questão, duramente criticado, e agora encontra plena ressonância na medida provisória, que acaba justamente com as disciplinas cujos conteúdos programáticos permitem e ensejam debates sobre tais temas. Será coincidência?

Outro ponto crucial do texto é a abertura da docência a profissionais não licenciados na disciplina lecionada, que podem ser substituídos por profissionais com “notório saber’’. Ora, um profissional graduado em administração, contabilidade ou engenharia, por maior que seja seu conhecimento em matemática, teve uma formação voltada à instrumentalização para seu ofício, na qual não cabem as disciplinas de didática, metodologia de ensino e estágio docente, que instrumentalizam o futuro professor. Considerando a MP, no entanto, não seria um despautério incluí-las nas grades dessas graduações, já que esses profissionais poderão lecionar matemática. Certo?

O “pacote” também instituía proibição do acesso ao ensino médio noturno a menores de 18 anos, o que penalizará, sobretudo, alunos adolescentes que, devido à pobreza, trabalham desde cedo para ajudar no sustento familiar. Vigorando a MP, a carga horária aumenta de 4h para 7h por dia o que, por certo, causará uma evasão escolar de proporções devastadoras.

Não à toa as novas diretrizes que aniquilam o ensino médio serão instituídas através de uma medida provisória, ou seja, as mudanças passarão a valer após sua publicação no Diário Oficial, mesmo sem a aprovação do Congresso. A quem possa interessar maiores detalhes, indico a página da ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, que tem publicado diariamente artigos e entrevistas com especialistas sobre o assunto. (Ver aqui http://www.anped.org.br/), pois o tema é serio e exige nossa atenção e mobilização.

José Benevides
Enviado por José Benevides em 21/10/2016
Código do texto: T5798678
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