Pão com improviso ao forno

Quem tem filhos adolescentes sabe: eles estão sempre famintos. E quem trabalha o dia todo e, por não ter quem cozinhe, ainda tem que chegar em casa e preparar o jantar, também sabe: há dias em que se quer mandar todo mundo comer macarrão instantâneo – cada um preparando o seu, evidentemente – e ir para a cama sem nem mesmo fazer a operação rescaldo na cozinha.

Num desses dias, cheguei em casa faminta e mal humorada de frio. Imaginei sentir um cheirinho bom de sopa vindo de dentro da casa ao abrir a porta, mas não passava de uma miragem olfativa: o que ouvi mesmo, fazendo as vezes de um caloroso cumprimento de boas vindas filial, foi: “Que é que vai ter de janta?”

Não cheguei a achar Herodes natural, como Vinícius, porque no histórico caso tratavam-se de crianças pequenas, e não de adolescentes. Porém, resignada e congelada, respondi: “Sopa!”. E lá fui à cozinha preparar a dita cuja, que até então não sabia qual seria.

Vasculhei o freezer, encontrei carne para sopa congelada; imediatamente coloquei o bloco de cerca de meio quilo na panela de pressão, juntamente com água, uma grande cebola, um dente de alho, uma folha de louro, um talo de alho poró e sal. Fechei a panela e fui tomar um merecido e desejadíssimo banho quente.

Muito mais bem humorada depois disso, comecei a, efetivamente, sentir o cheiro de sopa, que meu adolescente faminto (desculpem a redundância) também sentia. “O cheiro está bom, mãe”, ele me disse num sorriso, que retribui, agradecida – mas em seguida disparou:

-Vai ter sopa, e o que mais?

Ai, ai, ai, a sopa não era o suficiente! Calorias em número muito baixo para o metabolismo acelerado de um corpo masculino em formação. Respondi o meu já famoso “não sei, vou ver” e rumei à cozinha, para, de fato, ir ver.

Bem, primeiro tratei de finalizar a sopa, na base do improviso. O que colocar para dar mais consistência e sabor ao caldo? Fucei a geladeira e, maravilha das maravilhas, encontrei toneladas de mandioquinha! Piquei algumas dentro da panela, acertei o tempero e deixei-as cozinhando no caldo, junto com a carne, já muito macia. Santa Panela de Pressão!

Pronto, a sopa poderia ser servida em alguns minutos. Faltava o “e o que mais”. Um lanche? O pão de forma que tinha já estava perto da data de validade, e não havia nada que pudesse servir como recheio. E eu, após o banho redentor e vestida com roupas quentes e caseiras (ou seja, ridículas), recusava-me a sair de casa para comprar o que quer que fosse. Aí me ocorreu que o pão precisava ser usado, antes que se estragasse; e assim, de improviso, peguei as fatias e com elas forrei uma assadeira. Iriam ao forno, de alguma forma, para que fossem tostadas e perdessem a característica de pão quase vencido.

Ótimo, a base já estava pronta. O que poderia, enfim, dar graça ao pão? Voltei à geladeira: havia apenas algumas poucas fatias de mussarela. Antes de entrar em desespero, resolvi raciocinar: o que havia ainda em abundância na casa - além, é claro, de mandioquinha?

Cebolas! Havia cebolas. Piquei uma bem grande em rodelas finas, peguei uma frigideira para dar-lhes um leve refogado e ia começar a untá-la, quando me ocorreu utilizar manteiga ao invés de óleo. Combina mais com pão, pensei. E assim, refoguei na manteiga as rodelas de cebola, que se transformaram em brilhantes e cheirosos anéis translúcidos. Polvilhei sal e espalhei as rodelas proporcionalmente sobre as fatias de pão que estavam sobre a assadeira. Liguei o forno. E novamente pus meu improviso a funcionar, pensando no que colocar sobre as cebolas...

Lembrei-me de certa vez ter feito uns sanduíches de forno que eram cobertos com ovos batidos com leite. Achei que poderia ser uma boa idéia, até porque estes dois ingredientes eu tinha à mão. Bati dois ovos com um pouco de sal e abri a geladeira em busca do leite, mas me deparei com uma caixinha de creme de leite já começada. A combinação parecia ter futuro, e assim juntei creme de leite ao ovo batido, espalhando-os sobre o pão com as cebolas. Voilà! Queria ter posto também queijo ralado, mas este era apenas um ítem de minha lista de compras, e não uma realidade.

Levei os pães assim montados ao forno quente, e eles ficaram vistosos, pois os ovos estufaram um pouco sob o calor. Lamentei a falta do queijo ralado. Tirei-os do forno um pouco antes de ficarem prontos (não, não sei quanto tempo isso levou) e coloquei sobre eles as parcas fatias de mussarela anteriormente mencionadas, voltando a assadeira ao forno apenas para que derretessem. E assim que isso aconteceu, chamei meus filhos para jantar.

É certo que adolescentes famintos não são exatamente gourmets refinados, mas o fato é que o tal pão evaporou da assadeira. E com a sopa, que estava realmente saborosa, o jantar havia, finalmente, sido aprovado.

Enquanto dava cabo da louça, fiquei pensando se não seria uma boa idéia programar com certa antecedência o jantar do dia seguinte, para que não precisasse improvisar novamente... e constatei, estarrecida, que minha cota de imaginação estava completamente zerada!

Bem, concluí, amanhã será outro dia. E sei que sob pressão também se cozinha.