Meu Tamarindo

Meu querido tamarindo onde estás, que não te vejo mais, como te via antes. Hoje estamos separados, pela mão d tempo e do destino cruel. Quantos momentos eu não passei debaixo da tua sombra a cantar repente e ver os teus galhos embalados, pelo vento solto do Aracati. Tu foste no meu cântico selvagem a minha musa inspiradora e consolação da minha vida. Com a minha ausência ficaste abandonado, para sempre e por todos do meu velho lar, onde me criei. Hoje vives apenas arquejando, sem ajuda de ninguém e sem o amparo do teu dono. Foste sempre o encanto da minha vida de menino pobre e órfão. Perdeste todos os teus donos e ficaste estático no tempo. Ninguém da minha família vai te dar um abraço forte, como eu te dava. Vinte e cinco anos atrás tu tinhas este poeta amigo, para cantar a tua miséria e olhar para ti e fazer-te o bem. Meus parentes e teus donos já faleceram quase todos e os que estão vivos talvez não lembrem mais de ti. Em cada passo que eu dou eu me lembro da minha infância triste que passei pertinho de ti e da casa do meu avô paterno. Somos assim dois seres tristes e sem felicidade na vida. Tu vives ainda no abandono total e eu também padeço da mesma mágoa, sofro o mesmo desgosto sem ter a quem reclamar, ou ser socorrido. Temos uma existência bastante parecida, no sofrimento, no desprezo e no isolamento total. Não vou mais à Malhadinha e não tenho mais contato contigo e vivo triste assim como tu. Quando escuto algum canário cantar, vem-me a lembrança da tua rama escura, da tua sombra ingente, do teu perfil sublime que tanto me encantava quando eu cantava repente para os meus vizinhos e para as minhas tias, a minha primeira audiência de cantador novel. Tenho chorado muitas vezes pensando neste passado triste e espinhoso. Sonho às vezes com os velhos rebanhos de ovelhas que vinham descansar debaixo da tua sombra acolhedora. Ainda me lembro da minha rede de tucum que eu armava para descansar e ler o meu querido Guerra Junqueiro. Deixo escrito neste artigo a lembrança que tenho de ti e da casa que morei nela.

Poeta Agostinho
Enviado por Poeta Agostinho em 22/11/2016
Código do texto: T5831191
Classificação de conteúdo: seguro