Um avião de sonhos

E nós continuamos a enrolar, continuamos a enganar a nós mesmos de que tudo pode esperar mais um pouco, de que podemos alcançar a felicidade uma outra hora, em um outro momento. Ontem mesmo, assistia a um documentário sobre o piloto Ayrton Senna, e ele afirmava em uma entrevista que não havia alcançado a felicidade, mas que acreditava ter tempo para obtê-la, pois, segundo ele, estava na metade de sua vida. Eis que acordamos com essa triste e lamentável notícia. O avião que caiu não levava uma equipe de futebol ou jornalistas, transportava sonhos e alegrias plenas, vidas que viviam seu ápice profissional, mas, antes de tudo, transportava vidas como as nossas, que entraram no avião com planos futuros, que possivelmente deixaram pendências para serem resolvidas no retorno da viagem, que abraçaram e beijaram pessoas com a certeza de vê-las novamente em um futuro que parecia certo.

E é justamente por esse motivo que sinto muito a tragédia, que sentimos muito a tragédia, uma vez que poderiam ser alguns de nós ou um pai, uma mãe, um filho, um primo, alguém próximo. Eles não estavam em uma zona de guerra, não estavam em um ambiente hostil, não estavam em um local que, a princípio, oferecesse risco à vida. Aí é que nos enganamos, para colocarmos a vida em risco, basta acordarmos para trabalhar, basta sairmos de casa, basta estarmos vivos. E assim, mais uma vez, recebemos um aviso, uma prova de que confiar a felicidade apenas no futuro é tão incerto quanto apostar na loteria. A rotina engana, impregna em nosso inconsciente a falsa sensação do eterno, do tempo sem fim, quando, na verdade, somos todos fugaz, passageiros, frágeis e extremamente suscetíveis a todo e qualquer tipo de intempérie.

Entram para história os jogadores e comissão técnica desse time. E que possam, ao menos, em meio a tamanha tragédia, servirem, como mais um dos tantos avisos que recebemos continuamente, para acordarmos desse sonho monótono, desgarrarmos da rotina maçante, para termos sempre conosco, em nosso mais profundo íntimo, a certeza de que precisamos viver, precisamos olhar o mundo constantemente, viver as pessoas que nos rodeiam, amar os dias que são nos concedidos todas as manhãs que acordamos.

Lay Faggundes
Enviado por Lay Faggundes em 29/11/2016
Reeditado em 29/11/2016
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