Destaque à Mulata

Na organização de vários artigos para desenvolver o tema, mulatos, reconhecemos que, além desses artigos, cabia crônica para colocar em destaque a mulata.

Tudo que dissemos nos artigos sobre mulatos cabe às mulatas.

Entretanto, essa crônica vai tentar: reforçar o quanto o significado do termo mulata perdeu o sentido, com nosso processo de miscigenação; que no decorrer da história, tornaram o tipo mulata como irresistível a paixões; e propor atualização do significado do termo mulata.

No início, e perdura até hoje, o significado de que mulata é a mulher nascida da união de branco e de negro. Inclusive entende-se, como de forma geral, que essa união deu-se de forma compulsória entre o homem branco, representante do poder da Casa Grande e a escrava negra, da servidão da Senzala.

Foi desde tempos coloniais que poetas, como Gregório Mattos, já indicavam em seus versos sobre a graça do bailar e dos quadris das mulatas da Bahia.

Bem mais recente (século XX), para ilustrar, Ataulfo Alves, Braguinha, e Rodrigo Piva continuaram a reforçar a construção desse mito da paixão.

Cantaram eles: “Ó, mulata assanhada/Que passa com graça/Fazendo pirraça/Fingindo inocente/Tirando o sossego da gente!”; “Quando ela bole com os seus quadris/ Eu bato palmas e peço bis/ Ai mulata, cor de canela! Salve, salve, salve, salve, salve ela!”; “Nosso samba desacata/Quando tem o requebrado/Dos quadris de uma mulata”.

Além disso, Osvaldo Sargentelli,”mulatólogo” como ele mesmo se titulava, empresário da noite carioca, abriu casas de espetáculo como Sambão, Sucata e Oba-Oba, cujas protagonistas eram as mulatas, escolhidas com requinte tal, que constituíam monumentos a esse tipo físico.

Foi tão reconhecido que escolheram o dia e o mês de seu nascimento, 08 de dezembro, para a celebração do Dia da Mulata.

Na época, pela grande frequência de turistas aos espetáculos e, também, pela internacionalização de similares com mesmo conteúdo, foi criado o termo “mulata exportação”.

Assim, acreditamos que foi reforçada no imaginário do brasileiro, aquela imagem inicial, que se tornou constante em vários períodos de nossa história, de a mulata, como irresistível às paixões.

Evidentemente, embasados em como foi o berço da mulata e no racismo, muitos se contrapõem a essa construção e, certamente, promovem a desconstrução desse mito.

Cabe aqui, de passagem, a observação, de que esse mito não se restringe á mulata, mas sim de forma ampla à mulher. Basta dizer que existe o mesmo processo de transformação de ruivas, louras, negras... em mitos irresistíveis às paixões.

Poetisa que faz parte desse processo de desconstrução, Elisa Lucinda, no poema, “Mulata Exportação:” ... Olha aqui meu senhor:/ Eu me lembro da senzala/ e tu te lembras da Casa-Grande/ e vamos juntos escrever sinceramente outra história/ Digo, repito e não minto:/ Vamos passar essa verdade a limpo/porque não é dançando samba/ que eu te redimo ou te acredito: Vê se te afasta, não invista, não insista!/ Meu nojo!/ Meu engodo cultural! Minha lavagem de lata!/ Porque deixar de ser racista, meu amor,/ não é comer uma mulata!

Mas, paralelamente à atividade dos poetas, veio o desenvolvimento da ciência, e com isso, a evolução sobre nossa ancestralidade materna e paterna, por meio da Genética. Com isso, concluiu-se, que o brasileiro, como era de se esperar, tem sua ancestralidade materna mais incidente no índio e no negro e a paterna no europeu.

Ou seja, o brasileiro descende de europeus, africanos e como a origem de nosso índio está entre Ásia e Oceania, ou em ambas, podemos dizer que nos genes do povo brasileiro, estão presentes pelo menos três continentes, Ásia, África e Europa.

Somente para ilustrar, vamos tomar os resultados de pesquisa de ancestralidade realizada em duas personalidades conhecidas e, cujos tipos físicos podem ser enquadrados como mulatas: a ginasta Daiane dos Santos e a modelo e atriz, Ildi Silva: Daiane, 40, 8% europeia; 39,7% africana; e 19,6% ameríndia; e Ildi, 71,3% europeia; 19,5% africana; e 9,3% ameríndia.

Assim, urge atualizar o conceito de mulata de euro-afrodescendente para relacionado à cor da pele. Como cantou Braguinha, seriam as brasileiras com melanina suficiente, por já nasceram com tom de pele característico, ou o sol, durante sua infância e adolescência, as coloriu com cor de canela, ou de bronze, ou de chocolate...

Evidentemente, o mito da mulata instalado no imaginário do brasileiro está muito mais voltado para os aspectos físicos, para a forma. Mas, como toda mulher, como todo ser, tem ancorado à forma, a expressão mais íntima e sutil em sentimentos e pensamentos.

Visto assim, messa ótica a construção de mitos não faz sentido, pois todos são feitos do mesmo barro e animados, vivificados pelo bafejo do espírito.

Como num curto espaço de tempo, não será desconstruído o mito da mulata como irresistível às paixões. Como desde tempos coloniais exaltam seu bailar e seus quadris, propomos a seguinte atualização para o termo mulata: mulher brasileira com pele da cor de canela, bronze, chocolate... que, saiba sambar, ou dançar algum ritmo mestiço e, ainda, quando ande, desfile num gingar de quadris e numa sensualidade de desassossegar...

Mulata! Mestiça brasileira com a pele cor de canela, bronze, ou chocolate! Por muito tempo, ainda, continuarás: a passar com graça; a inspirar amores; e a tornar nosso samba desacato, com teu requebrado.

J Coelho
Enviado por J Coelho em 06/12/2016
Reeditado em 13/01/2019
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