A História que nunca contei...
 
     Corria o Ano de 1994. Recém-casados, eu e Elaine (minha ex-mulher) descobrimos que seríamos pais. Meu Deus, que glória, que felicidade. Eu, com meu instinto paternal aflorado, minha vontade louca de abraçar, de beijar, de ver crescer aquele pequeno ser que vinha para representar minha continuidade. Era uma benção, e ansiávamos muito por isso...

     Todo esse cenário de felicidade contrastava com um início de vida a dois muito difícil. Dinheiro curto, poucas economias, morando com meus pais, fazendo de um quarto pequeno nossa casa, nossa privacidade, e torcendo para que o minguado salário de Professor do Estado, somado ao da Rádio Emissora local, fosse suficiente para apaziguar os credores todo mês.

     Tinha que pensar no berço, nas fraldas, no enxoval, nos pequenos móveis daquele que viria para dividir conosco o pequeno quarto da casa dos meus pais, e que encheria nossa vida de luz. E a barriga começava a crescer, os dias se passavam rapidamente, e a ansiedade aumentava.

     Certo dia, ao sair do trabalho, corri para a casa e, lá chegando, abri a porta do quarto. Minha mulher estava sentada na cama, preocupada, tensa. Ao questioná-la, uma frase bateu forte em mim: “-Tive um sangramento!”... Não sei definir o que senti!

     O que ouvi do médico não apaziguou meu espírito: “- É normal! Vou receitar esse remédio, apenas se voltar a ter o sangramento!”... Saímos dali preocupados!

     À noite chegara, e com ela a chuva! E outro sangramento, e lágrimas... Muitas lágrimas! Sai de casa rezando, com um guarda-chuva que nada cobria, e pedia a Deus que o dono da farmácia vendesse-me aquele remédio fiado, pois não tinha dinheiro nenhum. Peguei o medicamento daquelas mãos caridosas e corri para a casa tentando salvar meu sonho, tentando salvar meu filho.

     Na manhã seguinte, acordamos bem... Ela se alimentou, e o dia se foi! Quando voltei para a casa, jantamos, e fomos nos deitar... De repente, outro sangramento...

     Corremos para o hospital! Lá chegando, por volta das 20h, ela foi levada para um quarto. E eu andando de um lado para o outro, na sala de espera, chorando, pedindo, implorando a Deus que não tirasse meu sonho, que não destruísse aquela paz, aquela esperança, aquela sensação linda de ser alguém, por poder dar a vida a alguém...

     Já se passava da meia-noite! Ao meu lado, sentado na sala de espera, um rapaz fumava desesperadamente... Subitamente, entra o médico e, me olhando com pesar, diz: “-Não foi possível salvar o bebê, Carlos! Já tomamos todas as providências! Ela ficará internada hoje e amanhã poderá ir para a casa!”.

     Desfaleci! Sentei-me num banco e fiquei parado, pensando, chorando baixinho... Meu filho se fora, sem que eu pudesse ao menos conhecê-lo. Fiquei sentado imaginando as coisas que poderia e teria feito se tudo fosse diferente! De repente, entra outro médico, e dirigindo-se ao rapaz sentado ao meu lado, diz: “-Nasceu, é um menino, parabéns, papai!”...

     O rapaz brilho e, sem pensar, me puxou com ele para ver seu filho! Enquanto olhávamos através do vidro seu pequeno herdeiro, eu ficava imaginando como seria sentir essa emoção, essa alegria, esse encantamento. E percebi ali o quanto a nossa vida é frágil.

     Subitamente o rapaz percebeu e, olhando-me com seriedade, disse: “- Sei que está triste com o que aconteceu! Mas nenhuma tristeza neste mundo consegue me contaminar hoje, meu caro! Pense que sua vez vai chegar, e quando isso acontecer, você entenderá exatamente o que estou falando! Não era para ser agora”...

     Este foi o presente que ganhei no dia 15 de outubro de 1994, Dia do Professor! Uma sensação de perda, de vazio, de solidão. A sensação que arrasa a alma, que destrói a esperança, que fere como adaga!

     O tempo passou e sobrevivemos! E com o passar dos meses, anos, nos fortalecemos! Novos empregos, novos desafios, novos olhares...

     Chegou o ano 2000 e, com ele, a efetivação numa Escola Pública de Sorocaba além da mais bela e importante notícia: iríamos ser pais! E no dia 03 de abril de 2001, às 8h40min, Brunna Marcelle veio ao mundo...

     Quando a olhei através da vidraça da maternidade, meu mundo ganhou outros contornos... Minha vida jamais seria a mesma! Meu mundo completara-se. Mas para que isso ocorresse, precisei esperar! Precisei me reconstruir! Precisei ser paciente, e acreditar sempre que existe algo muito maior!

     Por isso hoje, quando me perguntam, porque sou assim, nada respondo: Apenas sorrio e me recordo de tudo pelo que passei! Lembro-me de cada momento, de cada dor, de cada saudade! Recordo-me das privações, das angústias e entendo que possivelmente, o plano sempre fora esse!

     Desse modo, encontrei finalmente meu destino! O de contagiar e inspirar, através da minha profissão, a todos aqueles que, de alguma forma, ainda estão se encontrando! Sejam alunos, colegas, irmãos, pessoas que buscam dia após dia, um sentido bom e justo para estarem aqui...

     E enquanto escrevo este texto, minha Brunna está na sala, com seus fones de ouvido, desligada do mundo, como toda adolescente de 13 anos! E eu estou aqui, conectando meu coração nesta sintonia fina do bem, acreditando sempre, como testemunha viva, que tudo vai ser melhor!