[Meus demônios]

Estou num dia ruim: nada que faço parece dar certo. Falho miseravelmente na minha obrigação básica de estudante e vou ao banheiro para poder pensar e repensar na vida. Lágrimas de raiva se revoltam contra meus olhos e decidem ganhar vida própria no meu rosto: sinto muita raiva de mim mesmo, pois sei que, se eu erro, a culpa é minha e de mais ninguém. Mas eis que entra no recinto um homem já muito conhecido por mim, para o meu mais profundo desgosto: Maxwell Tavares sorri, pois está me zombando, e está muito feliz porque eu estou triste. Sinto meu coração palpitar e meu cérebro ordena que minhas pernas me tirem dali, mas estas são insolentes e decidem ficar paradas, estáticas. O homem decide falar.

“Mais uma vez fracassou, Marcos? Que bom! Você não se cansa de aumentar sua coleção de fracassos?”, ele diz, com ímpeto feroz, e eu, sua amável presa, não consigo fazer nada a não ser tentar me esquivar de seu olhar penetrante. “Foi muito bom você ter entrado aqui, sabia? Assim os seus castelos de ilusões desabam de vez. Você pensava que era inteligente, mas não é: só é um pouco menos ignorante que a média. O que não é grande coisa: além de ser bem menos inteligente do que deveria, ainda por cima não sabe usar o seu cérebro! Isto é patético!”, e ele ri, já que se delicia do meu medo e das minhas fraquezas. “Você é intelectualmente ordinário e, se conjugarmos isto à sua vida social, se é que você sabe o que é isto, temos um incompetente que atende pelo seu nome, meu querido!”, Maxwell continua impassível, irredutível, seguro de si e de tudo o que fala. “Se eu fosse burro, não estaria aqui, onde os melhores estão! Se eu fosse burro, não teria conseguido o que muitos sequer ousam em sonhar!”, respondo com um grito estridente, fechando os meus olhos para que, assim, quem sabe, ele possa sumir daquele lugar. “Se você fosse inteligente, não seria um aluno medíocre e uma pessoa ainda mais medíocre. Se você fosse inteligente, já teria mudado o mundo, como você sempre sonhou e nunca conseguiu. Se você fosse inteligente, as pessoas saberiam o seu nome por suas realizações, e não pela pena que eles têm de você. Se você fosse inteligente, eu não estaria aqui.”, e Maxwell ganha, ele sempre ganha, e sempre sorri, pois, se sirvo para algo, é para lembrar às pessoas de que é sempre possível se afundar mais!

“Olhe para mim, Marcos! Vejam só você: se escondendo de si mesmo num banheiro! Que ridículo! Diga-me, Marcos: como é ser uma sombra o tempo todo? Diga-me, Marcos: como é acreditar que você vai conquistar alguma coisa e se frustrar pela não realização disto todos os dias? Diga-me, Marcos: como é ser o esquisito, sempre calado, e, quando abre a boca, é só para dizer coisas imbecis ou só para implorar por um pouco de atenção, quase sempre sem sucesso? Diga-me, Marcos: como é passar grande parte do seu tempo acreditando que acumula conhecimento útil, quando ele é inútil para você, porque você não sabe se expressar? Responda-me!”, e Maxwell me olha furioso, pois não consigo dizer palavra, já que o ataque é feroz e não tenho argumentos para confrontá-lo. “Saia daqui!”, vocifero, pois é a única coisa que consigo falar, já que minha cabeça dói para tentar encontrar uma resposta aceitável para a minha existência. "Isto, Marcos! Grite! Insulte! Diga aos quatro ventos o quanto eu sou ruim! Mas você não pode negar isto: você é um fraco. É uma verdade absoluta, que se manifesta em você em cada uma de suas desprezíveis células. Ninguém gosta de você. Ninguém se importa com você. Você, Marcos, só se mantém vivo porque tem uma esperança ilusória de que o amanhã será melhor do que hoje. Porém, se você usasse um pouco da inteligência que você diz que tem, saberia que isto é mentira e que você só não se entrega à Morte porque tem medo dela. Você é fraco e é medroso, e se alimenta de ilusões porque a realidade nunca lhe foi palatável. Irrita-se comigo por eu te dizer a verdade: não posso fazer nada quanto a isto. Por que você não vai se entupir de comida e assistir a algum programa de entretenimento barato como você sempre faz nestes casos? É uma forma silenciosa e covarde de se suicidar, mas posso lhe garantir que é eficaz. Pense nisto, e bom dia.”, e finalmente o desgraçado sai da minha frente, deixando-me só e com a minha desgraça, enquanto eu choro porque a verdade é terrível e não sou capaz de fugir dela neste instante. “Por que eu ainda estou vivo?”, pergunto-me, sem conseguir uma resposta convincente.

Marcos Paulo Barbosa da Silva
Enviado por Marcos Paulo Barbosa da Silva em 08/02/2017
Código do texto: T5906749
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