E o coração? Oco.
Me olhou nos olhos e percebi que se assustou, tamanha era o oco do meu coração que se confundia com escuridão.
Meu corpo suado, cabelos arrepiados, sinto as bactérias caminhar por meu corpo...
E o coração? Oco.
Alma viajante, corpo andarilho, cigana vida...
E os olhos? Brilhantes.
Brilhantes, mas ainda sim escuros.
E o coração? Árido, sente falta de beijos molhados.
Percebi que ele sentiu medo, até pôs o pé esquerdo em falso – na pontinha do dedão. E que dedão lindo!
Aura trepida, energias saltitantes.
Mundo perdido... E o coração? Oco, seco e rarefeito.
Ora, pois, pode haver vida no deserto?
Florestas surgem. Árvores crescem. Animais correm. A relva se estende. O orvalho pinga.
Beijo molhado, apaixonado, que respinga em meu coração e o faz mais... oco. Molhado, mas, oco.
Todos os instrumentos musicais são feitos de sopro, pelo vento ou para o vento. A voz? Precisa do ar. Que serve a música sem ar para os pulmões, para levar as palavras, para apodrecer corações, encoleirar de ódio lancinante as pessoas...
E a alma? Voando, dançando, como um silfo do ar...
E o coração? Dançando aquele indie irlandês, imaginando um violão encostado na parede, você cantarolando no meu ouvido. E o coração agora? Batendo rápido do susto de quase ter perdido o ponto que este corpo surrado ia desembarcar.