Raio X Feminino
Por si só já sabia que estava fadada a enfrentar um mundo avesso a todas as formas consideradas, condenadas, inferiores por aqueles que um dia se autoproclamaram superiores, supremos.
Ainda quando criança, na escola, sentia-se menor, quando na verdade, sentia-se inferiorizada; pois era preterida pelas colegas na hora de formar os grupos; era sempre apontada por rodinhas de cochichos ela é piolhenta, tem cabelo de Bombril, ela é feia, ela fede etc e quando algo sumia, era ela quem recebia os primeiros olhares acusadores.
Ao passo que crescia, não suportou tanta diferença e indiferença. Abandonou a escola antes mesmo de concluir o Ensino Fundamental como tantas outras meninas. Então, foi assumir o lugar que acreditava ser o seu: o lugar de doméstica.
Às sextas-feiras, à noite, ia ao pagode com suas vizinhas, colegas de ônibus e profissão, irmãs de condição. Certa vez, seu olhar cruzou com o de seu colega de infância; observaram-se, dançaram. Beijaram-se. Saíram dali e foram para a casa dele. Transaram. Amaram-se. Ela ficou ali. Ela engravidou do primeiro filho.
Ele se tornou pai. Ele se tornou vadio, não queria trabalhar, não queria ajudar. Ele se tornou ciumento demais. Fez outro e mais outro, depois outro e outro filho nela, só para ela não ir embora. Era proibido tomar pílula. Ela apanhava. Ela era ameaçada. Eram cinco filhos e ela não tinha nem trinta anos.
Ela procurou a delegacia várias vezes, eles debochavam dela e não faziam nada. No Ministério Público, faziam pouco caso. Não tinha solução. Fugir com cinco crianças? Para onde? Quem acolheria? Seus pais não queriam lhe ajudar, talvez achassem que não pudessem nem com eles ou que não devessem por ignorância de suas criações.
Mas um dia ela fugiu com os cinco filhos para um barraco numa comunidade invadida. Foi estudar. Sempre trabalhando em duas ou três, às vezes, até quatro casas de família. Os filhos se cuidavam. Ele descobriu e os quis tomar. Força, coragem, vai ficar tudo bem! Tem que ter fé! Palavras que lhe sustentaram na hora de escolher entregar os filhos e continuar a batalha, logo eles estarão contigo pra sempre!
Trabalhou muito. Teve muita fé, muita coragem. Lutou. Superou muitas diferenças e indiferenças. Gritou como pôde ao mundo a luta da mulher; a luta da mulher pobre; a luta da mulher pobre e negra!
Estudou e se formou. Tem profissão: Técnica em Radiologia. Tem terreno próprio. Construiu casa. Trouxe seus filhos para junto de si. Governa-se!
Lutou. Superou. Venceu, mas a luta continua, ela ainda não acabou!
Por si só já sabia que estava fadada a enfrentar um mundo avesso a todas as formas consideradas, condenadas, inferiores por aqueles que um dia se autoproclamaram superiores, supremos.
Ainda quando criança, na escola, sentia-se menor, quando na verdade, sentia-se inferiorizada; pois era preterida pelas colegas na hora de formar os grupos; era sempre apontada por rodinhas de cochichos ela é piolhenta, tem cabelo de Bombril, ela é feia, ela fede etc e quando algo sumia, era ela quem recebia os primeiros olhares acusadores.
Ao passo que crescia, não suportou tanta diferença e indiferença. Abandonou a escola antes mesmo de concluir o Ensino Fundamental como tantas outras meninas. Então, foi assumir o lugar que acreditava ser o seu: o lugar de doméstica.
Às sextas-feiras, à noite, ia ao pagode com suas vizinhas, colegas de ônibus e profissão, irmãs de condição. Certa vez, seu olhar cruzou com o de seu colega de infância; observaram-se, dançaram. Beijaram-se. Saíram dali e foram para a casa dele. Transaram. Amaram-se. Ela ficou ali. Ela engravidou do primeiro filho.
Ele se tornou pai. Ele se tornou vadio, não queria trabalhar, não queria ajudar. Ele se tornou ciumento demais. Fez outro e mais outro, depois outro e outro filho nela, só para ela não ir embora. Era proibido tomar pílula. Ela apanhava. Ela era ameaçada. Eram cinco filhos e ela não tinha nem trinta anos.
Ela procurou a delegacia várias vezes, eles debochavam dela e não faziam nada. No Ministério Público, faziam pouco caso. Não tinha solução. Fugir com cinco crianças? Para onde? Quem acolheria? Seus pais não queriam lhe ajudar, talvez achassem que não pudessem nem com eles ou que não devessem por ignorância de suas criações.
Mas um dia ela fugiu com os cinco filhos para um barraco numa comunidade invadida. Foi estudar. Sempre trabalhando em duas ou três, às vezes, até quatro casas de família. Os filhos se cuidavam. Ele descobriu e os quis tomar. Força, coragem, vai ficar tudo bem! Tem que ter fé! Palavras que lhe sustentaram na hora de escolher entregar os filhos e continuar a batalha, logo eles estarão contigo pra sempre!
Trabalhou muito. Teve muita fé, muita coragem. Lutou. Superou muitas diferenças e indiferenças. Gritou como pôde ao mundo a luta da mulher; a luta da mulher pobre; a luta da mulher pobre e negra!
Estudou e se formou. Tem profissão: Técnica em Radiologia. Tem terreno próprio. Construiu casa. Trouxe seus filhos para junto de si. Governa-se!
Lutou. Superou. Venceu, mas a luta continua, ela ainda não acabou!