METEOROLOGISTA

Hoje, tentando resolver um problema pessoal, me imaginei perguntando à minha sogra o que ela faria no meu lugar. Como ela resolveria aquele problema. Creio que já expus aqui o quanto a considerava, era como uma mãe pra mim. E ao lembrar-me dela veio à minha mente um fato ocorrido lá atrás, logo depois que a conheci; ela nem me chamava de “filhote querido” ainda. Fora a terceira ou quarta vez em que trocamos algumas palavras.

Eu era um jovem de vinte e dois anos, estudante ainda, terminaria a faculdade somente no ano seguinte, mas já iniciara o namoro com a, agora, minha esposa. Estávamos numa das lojas dela, sentados num banco com almofadas, como dois pombinhos arrulhando, aquela coisa de início de namoro. A loja ficava num conjunto comercial, prédio alto, loja de frente pra rua, voltada para leste, e o prédio onde minha sogra morava ficava ao lado deste, num apartamento com vista pro oeste. Eu e minha esposa lá, abraços e beijinhos, quando entram minha sogra acompanhada de minha cunhada e olha de soslaio pra nós, com ar de reprovamento; ali era uma loja, tal comportamento não condizia com o local. Eu me levanto e cumprimento as duas. Usavam roupas leves e finas devido ao calor. Minha cunhada de broche e cabelo bem penteado, armado. Ambas muito bem arrumadas e elegantes. Minha sogra esquece, ou finge esquecer que nos viu abraçados e me pergunta preocupada:

- Será que vai chover? Não conheço bem o clima daqui – elas moravam há menos de um ano na cidade.

- Creio que não – disse eu.

Elas pretendiam ir até a outra loja, a um quarteirão dali.

- Vi umas nuvens carregadas e acho que pode chover... Talvez seja melhor eu voltar e pegar um guarda-chuva.

Era por volta de meio dia, em pleno verão. Eu olhei lá pra fora e o sol lançava seus raios quentes sobre o asfalto da rua. Saí da loja, olhei pro alto, nenhuma nuvem – “De onde será que ela tirou essa ideia de chuva?” – pensei. Corri o olho pelo céu, pro norte e sul, o prédio da loja é alto e não tive uma visão do oeste, aquele “sol de rachar mamona” e, numa imitação perfeita de Crocodilo Dundee, eu disse:

- Chover? Não... Podem ir tranqüilas. Creio que até o final de semana não cai uma gota sequer de chuva.

Disse isso de forma casual, pra impressionar a futura sogra, afinal queria causar uma boa impressão, como um bom conhecedor do clima da região.

- Está bem então – diz ela – Você deve entender disso melhor que eu.

Esse comentário me fez ficar em pose de falsa modéstia, certo de ter marcado um ponto a meu favor. Ela pegou minha cunhada pela mão e disse:

- Vamos então que temos muitas providências a tomar.

Fui me sentar enquanto elas desciam o degrau de entrada. A rua é relativamente larga e eu fiquei observando, esperando até que dobrassem a esquina e pudesse voltar ao namoro.

Elas esperam um carro passar e iniciam a travessia da rua. Quando estavam bem no meio dela, vi uma cena tirada de desenho animado. Despenca o maior toró em cima delas. Não falo de uns pinguinhos d’água não! Chuva forte, de repente, despejada mesmo! Por um segundo percebi a indecisão delas se terminavam de atravessar a rua ou voltavam. Resolveram voltar, enquanto eu me afundava nas almofadas do banco. Eu não sabia se ria ou se chorava pela “bola fora”(gíria da época). Devo confessar uma coisa aqui: Em algumas situações trágicas, tenho vontade de rir, mais pela situação que de nervoso.

As duas entram na loja, parecendo dois pintos molhados. Minha sogra, toda encharcada, estendendo a bolsa pra minha (então) namorada, receando molhar os documentos, com um lencinho enxugando o rosto tentando vencer a água que escoria pelos cabelos, e minha cunhada com os cabelos também encharcados, caídos de lado, olhar assustado...

Repito: Eu não sabia se ria ou chorava. Não sabia o que fazer ou dizer, ou onde me enfiar. Ela diz (e eu sabia que na verdade estava me questionando):

- Sabia que ia chover. Aquelas nuvens todas...

- Poxa... – respondi – Essa eu não entendi. Estava o maior “solão” lá fora! Não vi nuvem nenhuma. Não sei como isso pode ter acontecido.

- É que pra esse lado (leste) estava claro, e daqui não dava pra ver – amenizou ela – Mas pro lado de lá (oeste), do nosso apartamento, dava pra ver nuvens escuras, carregadas.

- Isso não costuma acontecer. É um caso raro. Vocês tiveram azar de acontecer justo agora... – foi a única coisa que me ocorreu dizer.

- Vou voltar ao apartamento, tomar um banho antes que pegue um resfriado.

- Mas a chuva passa logo. É chuva de verão. No máximo em cinco minutos o sol se mostrará novamente.

As duas já estavam saindo. Desconfio até hoje que elas não acreditaram muito naquela nova previsão meteorológica. Não lhes tiro a razão; choveu por mais de uma hora.

Naquele momento fiquei sério, preocupado com a (má) impressão que causei. Mas depois daquele susto, esqueceram-se(?) do fato e acabamos nos dando bem com a convivência. E sempre que me lembro daquela situação, da cena hilária, dou boas risadas. Pela cena e por minha falta sensatez. Falta de sensatez por não querer saber o porquê delas esperarem chuva e a precipitação em agradar as duas.

Aprendi com isso, a ouvir, a analisar as possibilidades, conhecer o problema antes de dar qualquer opinião ou sugestão.