Naquela manhã

Naquela manhã, como de costume, o relógio desperta às 6h e novamente às 6:30h. Salta da cama a uma velocidade quase automotiva e vai ao banheiro. Toma banho, escova os dentes. Troca de roupa.

Na cozinha, abre a geladeira, pega a caixa de leite quase vazia, e bebe ali mesmo todo o restante. Corre para a porta de saída apenas com um pedaço de pão enfiado na boca.

Vai até a garagem. Esquece as chaves do carro. Volta ao quarto e as pega. Dá partida e sai, apressado. Atrasado.

Dirije furioso em um trânsito quase parado por completo. Liga a rádio e ouve uma música. Xinga o motoqueiro que esbarra em sua lateral, mas decide não sair do carro. Ouve a música. Atento. Não era qualquer música, era a favorita de sua esposa quando a conheceu. Lembrou que nem sequer olhou para ela ao sair desesperado. Não lhe deu bom dia ou a beijou. Simplesmente saiu.

No quebra-sol uma foto abraçado com os dois filhos. Naquela manhã não abraçou e nem desejou boa aula. Simplesmente saiu.

Mal tomou café. Mal acordou. Mal dormiu durante dias, essa era sua rotina, sua vida, seu fardo e assim foi se desgastando. E se distanciando de tudo o que antes foi para ele o mais importante e precioso. Mas sua carreira ia bem. Não poderia jamais desagradar o chefe ou trocar de emprego. Ganhava muito mais do que qualquer outro de sua idade.

Mas naquela manhã saiu e percebeu que tudo o que valorizava na verdade não valia mais que sua família. Mas percebeu já muito tarde.

Naquela manhã saiu, e teve sua vida interrompida. Saiu pra nunca mais voltar.