Sr 90 dias

Idade: 23 anos

Trabalho: Ipiranga Petróleo

Meu nome: Sr 90 dias!

Estranho? Não caro amigo, é a mais pura realidade, este era meu “nome” quando aqui cheguei para trabalhar! 90 dias!

Vindo de São Paulo capital, desconhecia muito as diferenças entre os estados do Brasil. Hoje sei do que são feitas as pessoas significativas, mas quando jovem, via a vida atrás dos óculos dos sonhos!

Cheguei na região de Londrina por volta de 1973 à pedido da companhia onde um cliente acabou me “batizando” de 90 dias. Apelido este dado porque era o prazo que os vendedores ficavam, nessa companhia, nesta região. Olha só que interessante, de “90 dias” me tornei a pessoa que conseguiu fazer da região uma das mais produtivas de todo o distrito de Londrina em pouco tempo.

As vendas de óleo Ipiranga que na época ninguém comprava, saltaram de 1.200 litros mês para 14.000 litros mês, eu era “o cara” tive ótimos professores pré Ipiranga, não tive outros melhores dentro da companhia, mas aprendi desde cedo que seja o que for que você intenta fazer, precisa ser o melhor! E nesta função, eu era o melhor!

Fazia parte da minha região várias cidades pequenas sem muita estrutura, e foi assim que num dia de trabalho entrei numa cidadezinha por uma rua chamada Tuiutí. O nada era a palavra mais próxima que eu encontro para descrever o que tinha à volta. Mantendo-me na mesma direção cheguei a uma praça chamada Manoel Ribas, a praça era muito linda, imagino! Nada pude ver porque estava tudo escuro! As ruas eram de paralelepípedo e estacionei em frente ao único centro comercial que tinha na cidade.

Diante de tamanha e desconfortável descoberta do lugar e de toda a energia que ali se manifestava pensei: Eu não ficarei aqui de forma nenhuma! Sequer eu desci do carro, já grandemente determinado e ousado fiz meia volta e cheguei em Londrina. Não havia quem me convencesse de que ali era um lugar para se trabalhar e pensando assim, na manhã seguinte, fui à companhia conversar com o meu gerente.

Enchi o peito de determinação e coragem e disse em tom decisivo: Sr Almeida, lá naquela cidade eu não vou trabalhar não! Sr Almeida sequer levantou os olhos para me ver todo empinado em sua frente e falou diretamente com sua secretária:- Sra. Joana, recolha todos os documentos da empresa, recolha a frota, pegue as chaves porque o sr “90 dias” não quer mais trabalhar conosco!

Meu coração disparou, imagine! Eu jamais tinha tido um carro nas mãos, me achava dono de mim mesmo e sr das situações que enfrentara até então, o sangue subiu e desceu em minha mente umas duzentas vezes, meio estático e ainda firme na minha decisão continuei o diálogo!

- Mas eu não quero trabalhar naquela cidade! Ao que prontamente ele respondeu:- É lá, ou é rua!

Tremi! Se é certo que colapsamos a função de onda sempre que um circuito neural se estressa, ali, naquele momento o meu já estava em curto, tremi! Silencioso por não mais que segundos mas como se horas tivessem passado pensei:

Considerando o início do meu casamento, considerando que não seria fácil perder o que já havia alcançado até então, e considerando ainda a ordem expressa do gerente, em pleno regime militar, nada mais me restou senão engolir minha decisão, e movido da mesma determinação que me levou lá falar com o sr Almeida “arriei minhas calças”, peguei as chaves e documentos de volta e lá fui eu.

Aquela cidadezinha não mudou absolutamente nada de um dia para o outro, mas lá eu aprendi que as vezes se é necessário tirar leite das pedras, ou então morremos de fome se não tiramos os óculos dos sonhos dos nossos olhos!

Uma homenagem ao meu irmão: Oto Corrêa

RACHEL IN CONCERT
Enviado por RACHEL IN CONCERT em 30/07/2017
Código do texto: T6069170
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