UM FILHO CUIDA DO PAI.
Ele devia ter 13, talvez 14 anos, não sei precisar a idade certa. Eu tinha comprado a CASA DA BOLACHA, do meu amigo TIÃO, o movimento era grande, o dinheiro pingava igual água em torneira mal fechada. Abríamos as 8 horas e fechávamos as 18.30, vendíamos não somente bolacha, mas uma variedade imensa de balas.
Minha casa ficava nos Campos Elíseos, e tínhamos voltados a morar nela, após morarmos quase dois anos em um casebre em uma vila que ficava próxima a casa da minha mãe, tempos difíceis, porém mantínhamos a fé de que tudo um dia se resolveria.
Já contei a história do jogo do bicho, onde acertei a milhar na cabeça, emprestei dinheiro para o meu irmão Claudemir, e comprei um fusca vermelho para a Salete.
Era uma sexta feira, e o movimento constante fez a fome apertar, liguei para casa, minha filha Tatiana era pequena e dava muito trabalho, arteira.
Pedi para que a matriarca me trouxesse comida, insisti pelo telefone, que estava com muita fome, e não queria almoçar no Bar do Zezinho, pois sabia que em casa tinha costelinha de porco na cebola.
A resposta da então esposa foi clara.
--- não tenho como sair de casa para levar a comida para você, a Tati ainda nem tomou banho. A comida já está pronta, vou ver se alguém pode levar, vou ligar para o Vitinho.
Vitinho era o meu cunhado, que vez ou outra ia em casa, estava de férias, provavelmente se estivesse à toa, levaria a comida.
O tempo foi passando, e a fome a cada minuto apertava mais.
Não queria comer também as guloseimas que eu vendia, pois já estava ganhando peso demais desde que a loja passou para o meu comando. Balas, chocolates, bolachas, biscoitos, eu estava me tornando obeso.
Já tinha passado mais de uma hora, quando eu sentado no caixa vi o carro, o Fusca vermelho contornado o Mercado Municipal lentamente, passando pelo guarda de trânsito como um exímio corredor de fórmula um. O grande problema é que o carro se locomovia sozinho, eu não conseguia ver o motorista.
Levantei-me rapidamente do caixa e fui até o carro que estava estacionando ao lado da porta lateral da loja com maestria. Foi então que eu vi o meu filho André, sentado sobre um ou dois travesseiros, mais outro em seu costado, e com a minha marmita no banco do passageiro.
Ele abriu a porta como se tudo o que estava fazendo fosse o mais natural possível. Neste ponto eu já estava esbravejando, não levando em conta o esforço que ele fazia.
--- Quem mandou você pegar o carro da sua mãe, está louco, eu posso ser preso se a polícia te pega dirigindo.
Como sempre, André se manteve calmo.
--- aqui está sua comida pai, foi fácil, eu dirijo bem.
--- sua mãe é louca. – esbravejei.
--- eu dirijo melhor que ela pai, o senhor sabe disso. – não poderia negar essa afirmação, mas também não poderia concordar com ele na direção. Continuei, reclamando.
--- você passou pelo guarda de trânsito, e se ele tivesse parado você.
--- não ia parar pai, não viu que é o INÁCIO, seu amigo do futebol, ele até me mandou
passar logo, e parou o carro de trás. – Meu primogênito abriu um largo sorriso.
Eu estava com muita fome, peguei a chave do carro primeiro, e a marmita depois.
Ele correu para o caixa, gostava de ficar fazendo troco. Eu fui almoçar a minha comida predileta, costelinha de porco acebolada, feijão com linguiça e arroz.
Hoje, já passado tanto tempo, eu fico imaginando que família maluca eu tinha, fazíamos coisas que só de pensar, minhas pernas tremem.
Obrigado filho pelo almoço.
UM FILHO CUIDA DO PAI