Então chegou setembro
Sempre, já em meados de agosto, eu começo a pensar “ setembro vai chegar”.
E fico esperando, qual criança à espera de brigadeiro na festa da casa da tias especialissimas, como a minha tia Norma. Sim, na casa da minha madrinha até os brigadeiros eram mais saborosos, com uma textura mais firme e com chocolate mais refinado.
E eu fico esperando setembro há anos. Mas não quero me lembrar daquele setembro que começou em 39 com a invasão da Polônia pelas forças nazistas. Não o mês do dia onze, nem o do falecimento do meu tio preferido. Mas um mês da explosão da esperança, luz e graça.
Uma esperança que teima em não ir embora, que está colada na minha alma desde que comecei a não ter vergonha de sentir, embora não pudesse falar de sentimentos para ninguém. E eu esperava, silenciosa e solenemente, a primavera desabrochar e cantar sobre a profunda beleza do viver e do existir.
Já explodem algumas flores rosadas e brancas no meu pé de manacá de cheiro, comprado recentemente numa cidade para mim deslumbrante. A figueira já se mostra forte e faceira preparando o tempo para os frutos tão doces e macios. Poéticos figos a inundar a alma de pura e vibrante energia vital.
E setembro vem me convocar para a certeza de que a vida vence e vencerá sempre, apesar das vergonhas, das trapaças, da irresponsabilidade com o outro, da falta de alteridade e de mansidão na alma.
E os pássaros cantam na sua feliz plenitude na praça de frente à minha casa, que resistem aos automóveis e motos turbulentas a lhe arremessar toxinas. Resistem e cantam para os viciados que se agrupam nos bancos e que não querem saber se a vida é boa, apesar de milhares de pesares. E cantam, voam, às vezes solitários, mas extasiados com a liberdade de existir.
E setembro está aí, novo, dando de ombro às indecências, à ganancia, à melancolia e convidando a viver, a poetar, a saudar e sorrir para Deus na sua bondade absoluta. Hora de ouvir “Sol de primavera” na melodiosa voz de Beto Guedes e refazer a alma, convidando a sermos pessoas melhores, simplesmente porque é bom e macio fazer o bem.