Viagem no tempo.

Enquanto estou dentro dessa sardinha de ferro, aço e plástico, vulgarmente denominado de ônibus, lá fora o tempo passa veloz e com ele todos os nossos sonhos e ideais. Nesta minuta escala de Km entre Santa Brígida e Paulo Afonso, me vem à memória criptografias de imagens aprisionadas na aureola do tempo, deste mesmo tempo que acaba de passar por mim.

Essas imagens que agora me são apresentadas como que em uma sala de cinema 3D retratam dois irmãos congênitos, Antônio Carlos e Eu. São tantos os fragmentos dos quais somos feito que nem mesmos os enlaces do tempo conseguiram separar. Não fomos lapidados como diamantes, viemos diamantes lapidados, sem querer ser narcisista, pois temos defeitos “pequenos” me acho e avariações múltiplas agrupadas de algumas qualidades proliferadas ainda no berço.

Não possuímos mais o brilho nem o contraste das cores da juventude impregnado nos olhos, e muito menos o vigor viril de outrora, somos partículas de um conjunto alegre, ou triste, com tonalidade viva ou pastel, de estética harmônica ou desordenada que mesmo estando um pouco envelhecida e desgastada pelos acumulo dos anos vividos, sofridos e superados, eu disse superado? Não, superados ainda não, mas vamos em frente, que nem sequer podemos supor o real valor do conjunto da obra, mas permanecemos na face da terra a admirar o sol, a enamorar a lua, enquanto muitos e muitos amigos, conhecidos e mesmo familiares seguiram numa viagem rumo ao infinito com passagem carimbada na alfândega da morte.

Antônio Carlos também continua da mesma forma, com uns quilinhos á mais, assim feito eu. Também perdeu para o branco das nuvens a coloração castanha dos cabelos, “verdadeiros heróis da resistência” que teimam em não caírem. No entanto conserva nos refolhos da alma os mesmos defeitos mesclados com as qualidades de fabricação. Em nossas vidas nem tudo foram flores, havia inúmeros espinhos a nos dilacerar a carne. Com rara exceção havia também algumas poucas rosas das quais roubávamos o aroma para levá-lo na pele e soltar num abraço dado na namoradinha de infância.

Não fomos ainda vencidos pelo prazo de validade, apesar de bem maduros continuamos com o espírito jovem. Enquanto Carlinhos, como carinhosamente denominou a nossa genitora, desde cedo fora incrível, não o titã de pele esverdeada que povoara a nossa meninice, e tentara ser enquanto criança, mas um gigante diante as dificuldades impostas pela vida, enquanto eu o Durango Kid.

E continuo vendo nos flashes de minhas reminiscências, o quanto brincamos lado a lado, aniversariamos e brindamos lado a lado, sempre regados a vinho, Pirassununga com ki-suco, Mazille e rios de cervejas. Coincidência ou acaso destino “uma obra manual de Deus”, a diferença da nossa data natalícia são os anos de nascimento, pois o dia e o mês são homogêneos.
Trabalhamos lado a lado, perdemos lado á lado, sofremos lado a lado quando o Mengão foi derrotado no “Clássico das Multidões”, como foi imortalizado o FlaxFlu pelo jornalista Mário Filho (Torcedor do Flamengo), irmão do também jornalista e escritor Nelson Rodrigues (Torcedor do Fluminense), que é autor de diversas frases sobre o clássico como “O Fla-Flu não tem começo. O Fla-Flu não tem fim". "O Fla-Flu começou quarenta minutos antes do nada". "E aí então as multidões despertaram”.

Da mesma forma “lado a lado” assistimos o Flamengo no outro lado do mundo, vencer o Liverpool por 3x0, e conquistar a Libertadores das Américas de 1981. Fomos testemunhas oculares do “Fabuloso” Tri-Campeonato conquistado pelo rubro negro diante do herói português em 1999, 2000 e 2001 e ouvimos as girândolas estrugirem no céu.

Acordo desta letargia com uma freada frenética, e chego ao ponto de descida, e deixo para trás aquela sardinha de ferro, aço, plástico e ferrugem que segue seu curso levando em seu interior um bando de sonhadores, perdedores, vencedores e mesmo idealizadores quanto nós. As vitórias foram bem poucas é verdades, porem imensuráveis que neste momento estão guardadas no porão dos 45 e 47 anos da sala de troféus da perseverança onde continuamos “quase” os mesmos.
Marcos Antônio Lima
Enviado por Marcos Antônio Lima em 04/09/2017
Reeditado em 09/09/2017
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