ÁVILA – IMPERDÍVEL LEITURA – PARTE II

Volto a tratar de nossa visita a Ávila. O texto a seguir complementa o muito dessa maravilha medieval, incrustada em terras espanholas. Leia e sinta o valor da oportunidade de conhecer mais uma parcela da joia turística da Espanha. Assim, como o leitor o fez, relativamente a outras preciosidades do mundo antigo e contemporâneo, expostas pela pena deste modesto escrevinhador. Boa leitura!

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Andamos por boa parte da cidade, ciceroneados por Javier, guia turístico que nos acompanhou desde Madrid até Segóvia, último destino de nossa recente peregrinação por terras de além-mar.

Em um desses passeios, visitamos o Convento das Carmelitas, local que guarda o passado histórico-religioso de Santa Teresa de Jesus ou Santa Terezinha, como a conhecemos no Brasil. A partir do parágrafo seguinte, tentarei descrever, embora sucintamente, parcela da vida secular e religiosa da santa católica, detentora da devoção de muitos dos nossos patrícios.

Teresa Sánchez de Cepeda Y Ahumada nasceu em Gotarrendura, província de Ávila, no dia 28 de março de 1515 e faleceu no dia 4 de outubro de 1582. Era filha de Alonso Sánchez de Cepeda e de Beatriz de Ahumada Y Cuevas. Teresa foi canonizada em 1622, pelo Papa Gregório XV, passando a ser conhecida como Santa Teresa de Jesus.

Ela também era conhecida por Teresa de Ávila e descendia de linhagem nobre, pois sua mãe, Dona Beatriz, pertencia aos nobres da casa dos Ahumada. Do contrário, não poderia ser canonizada, porquanto os paradigmas da Igreja Católica estabeleciam que, para ser santa, a pessoa tinha de pertencer à nobreza e ser abençoada por Deus.

Em vida, Teresa foi uma piedosa cristã, devota da Virgem Maria. Órfã de mãe aos quatorze anos de idade, desenvolveu exagerado interesse por leituras relacionadas à vida de santos, época em que foi enviada ao Convento de Nossa Senhora das Graças, em Ávila. Ali, ficou internada em escola de freiras agostinianas.

Antes de tornar-se freira, Teresa foi acometida de severa doença que, diz-se, ter sido malária. Os médicos não deram conta de curá-la do mal, levando-a a suportar bravamente o sofrimento infligido pela enfermidade, mediante a leitura de livros místicos medievais, entre eles, um cujo título inspirativo era O Terceiro Alfabeto Espiritual, de autoria do Padre Francisco de Osuna. Também se valeu da leitura de outras obras versando sobre exercícios espirituais como, por exemplo, orações, privações e a mortificação do corpo.

Durante a enfermidade, ela conta que em suas orações silenciosas, mental ou em devoções de êxtases, experimentava absoluta sujeição a Deus e recebia “bênçãos de lágrimas”. Conhecidos da ainda noviça achavam que o conhecimento que lhe era revelado advinha de origem diabólica e não divina.

Por conta dessa situação vexaminosa, Teresa passou a afligir-se com diversas formas de mortificação. Seu confessor, padre Francisco de Borja, reagiu às críticas dizendo-lhe que os seus pensamentos tinham origens divinas.

No dia 29 de junho de 1595, ela confirmou ter sido agraciada com a aparição de Jesus, de corpo presente, embora de forma invisível. Tais visões continuaram por dois anos consecutivos e, em uma delas, Teresa teria sido atingida por uma lança dourada, atirada por um Serafim, provocando-lhe dores que classificava de corporal e espiritual. Disse, ainda, a propósito dessa experiência:

"Eu vi em sua mão uma longa lança de ouro e, na ponta, o que parecia ser uma pequena chama. Ele parecia, para mim, estar lançando-a por vezes no meu coração e perfumando minhas entranhas; quando ele a puxava de volta, parecia levá-los junto também, deixando-me inflamada com um grande amor de Deus. A dor era tão grande que me fazia gemer; e, apesar de ser tão avassaladora a doçura desta dor excessiva, não conseguia desejar que ela acabasse".

Inspirados nos comentários dessa visão, Bernini, cujo nome completo é Gian Lorenzo Bernini, nascido em Napoli aos 7 dias de dezembro de 1598 e falecido em Roma, no dia 28 de novembro de 1680, elaborou a escultura intitulada O Êxtase de Santa Teresa, que se encontra exposta na igreja de Santa Maria della Vitória, em Roma. A irmã Teresa dispôs-se a imitar a vida e os sofrimentos de Jesus, pedindo-lhe: "Senhor, ou me deixe sofrer ou me deixe morrer".

No dia 2 de novembro de 1535, Teresa foi admitida no Convento Carmelita da Encarnação, em Ávila. Com o passar do tempo, indignou-se com a atitude das 150 freiras do claustro, que relaxavam quanto à observância dos preceitos a que se propuseram ao ser admitidas na clausura. Teresa também reprovava o assédio de visitantes ao convento, cujas visitas eram recheadas de conversas fúteis, em detrimento das orações e reflexões espirituais que defendia com ardorosa vocação. Em 1562, contando com incentivo do padre São Pedro de Alcântara, seu mentor espiritual, a religiosa fundou um novo claustro, cuja empreitada foi financiada por Guimara de Ulloa, rica senhora de seu convívio.

Ao longo de sua vida, com apoio financeiro de algumas autoridades eclesiásticas e seculares, Teresa fundou outras casas de sua ordem religiosa em Medina del Campo, Malagón, Valladolid, Toledo, Pastrana, Salamanca e Alba de Tornes.

Outros episódios marcaram a vida de Teresa de Ávila, sobre os quais declino de comentá-los, não apenas por ausência de elementos históricos, mas, e principalmente, por não ser esta a minha intenção. Meu compromisso com o dileto leitor é bem mais modesto.

Na fase final deste capítulo, apraz-me mencionar mais o seguinte: Em 1617, as Cortes Generales concederam a Teresa Sánchez de Cepeda Y Ahumada o título de padroeira da Espanha, e, em 1622, o Papa Gregório XV a canonizou, enquanto o Papa Paulo VI proclamou a santa como Doutora da Igreja Católica, em reconhecimento a sua profícua vida literária. Ela é autora de O Castelo Interior (1588) e Caminho da Perfeição (1583).

Ao narrar episódios da vida de Santa Teresa de Jesus, ultrapassei os limites de minha proposta literária, qual seja, a de falar e descrever o mais resumidamente possível sobre os lugares visitados nesta viagem que narro sem pretensões.

Nossa visita a Ávila foi um agradável prazer. Conhecer sua arquitetura medieval, igrejas de estilo gótico-românico e palácios da época do Renascimento – movimento intelectual do século XV, que recuperou os estilos da Antiguidade greco-romana – foi uma imperdível satisfação.

Na próxima crônica, falarei de nossas andanças por Segóvia, outra “joia da coroa espanhola”. Não perca!

Hasta la vista!