Mundo Extranho.

Não existe explicação para a existência de tanta maldade no coração das pessoas; éramos residentes em uma comunidade pobre, muito pobre; todas as pessoas ali viviam abaixo da linha da pobreza sobrevivendo com restos de tudo que elas pudessem encontrar no lixão que chegava todos os dias, e que era dividido entre seres humanos e animais; urubus, cachorros e porcos. São mais de trinta barracos em volta do grande lixão, onde o Município é ausente, o Estado é ausente a União é ausente; os que ali residem são miseráveis, massa de manobra para políticos e governantes corruptos, que nunca pisaram seus pés imundos naquela comunidade. Moram ali: Dona Marlene e seus quatro filhos; de onze, de dez, de nove e de oito anos; seria mais, se a morte não tivesse feito o favor de levar parte deles. A morte também levou seu companheiro, que não sabia fazer outra coisa, só filhos.

Também moram ali: Dona Francisca e seus dois filhos, o mais novo com quatro anos e o mais velho com sete, filhos de pais diferentes; este ultimo, surdo-mudo. Ali mora também seu Ramiro viúvo de dona Antônia que morreu a mais de dois anos vítima da leptospirose, deixou cinco filhos, o mais velho com oito anos. Eu? Eu sou Josué, dona Adália, minha mãe e meu pai Rufino, também moramos aqui e já faz um bom tempo; nosso barraco feito com sobras de madeira e restos do lixão, é pequeno, apertado, e não tem nenhum conforto. Dá pra nós três vivermos até a morte nos achar; mãe já não pare mais, perdeu o seu útero pra doença ruim, e por milagre escapou com vida. Eu estou completando quatorze anos e não conheço ainda o mundo lá de fora; nunca sai daqui, até hoje não pude ir à escola por que não tenho certidão de nascimento, e assim como meus pais, também sou analfabeto. Meu futuro é incerto, aliás, nem sei se terei futuro. Para os senhores governantes desse País, nós somos apenas números, estatística; somos uma triste realidade.

Daqui desse lixão tiramos o nosso sustento; até a comida que comemos vem dele, é o que sobra das mesas fartas da elite; sobras que todos os dias chegam, mas com tantas bocas pra comer às vezes falta. Não sabemos até quando vamos viver aqui, mas de uma coisa temos certeza; vamos continuar vivendo aqui abaixo da linha da pobreza na miséria absoluta, só Deus sabe até quando, a morte também.

Guel Brasil
Enviado por Guel Brasil em 06/02/2018
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