O ventilador

Esta é outra daquelas viagens tal qual “Está tudo aqui ”. Se você não gostou daquela nem embarque nesta. Já, se viajou junto eu te aviso que esta vai pela mesma linha, e se não gosta de reprises, também não embarque nesta: o modus operandi é o mesmo, onde eu sentado de frente para o desktop busco alguma inspiração. Sei que soltando os dedos o final esta garantido. Não sei se darei uma dentro (Dalton in’s), mas piração, ah esta vocês podem contar.

Começo minha caçada ao tesouro, procurando um motivo para escrever. De uma árvore da minha cabeça, o que o fruto duro me reserva? Ainda não sei sobre o quê. Meus olhos tentam puxar conversa com os objetos mais próximos: cadeira, mesa, mouse, ventilador permanecem indiferentes.

Mas não desisto. Insisto. Eu sei que em algum lugar está a chave. Da cabeça o desentrave. Aquele bilhete de embarque.

Sabe aqueles livros com imagens em 3D camufladas que já foram uma febre? Você tinha que procurar ver o que estava por trás daqueles desenhos sem sentido e você ficava louco(a) para descobrir o segredo, para ver a imagem por trás da imagem. Enquanto não descobria achava que era uma pegadinha. Você não sabia como. Alguns diziam que você tinha que concentrar num ponto, outros que deveria ver a imagem sem pensar em nada. Você tentava um jeito, outro e de repente imagens saltavam do livro em dinossauros, borboletas e outros bichos. Você ficava maravilhado. Como aquilo poderia estar ali e você não ter visto? Era uma espécie de transe do careta. Pois é, assim eu fico com os objetos deste meu quartinho. Sei que em algum momento vou conseguir manter uma espécie de comunicação com algun(s).

Atenção o ventilador que está num balcão às minhas costas me sopra algo no ouvido. Abstração / concentração. Sabe aquela ilusão de ótica que faz parecer que uma roda raiada de um carro em movimento gira para trás? Apesar das hélices do ventilador me empurrarem o vento, sinto uma força me puxando. Acho que é aí. Lufadas de vento me arrastam para o olho do furacão. Imagens que me remetem a outras imagens são como o que na física se teorizou como buracos de minhoca e me vejo em pouco tempo a anos luz daqui ou a muitas dimensões daqui. Num lugar onde reparto o espaço com um Stephen Hawking chutando sua cadeira no buraco negro. Mas não existe um limiar, meus pensamentos não têm uma gravidade, não sou sugado por nenhuma força ou sou igualmente puxado por todas e me sinto livre. Posso também chutar o balde. Bom, pelo menos era assim que eu estava pensando a apenas alguns milhões de anos luz agora pouco. Mas este espaço dos devaneios é muito volátil. Certezas são quimeras. O ventilador me chama para meu quarto e quando olho para ele, com seu movimento de vai e vem e o final do curso voltando e girando para o outro lado parece me dizer:

-Tss, tss, - como quem reprova meus delírios. De pronto aperto um botão que fica na parte superior e deixo-o fixo.

-Não foi você quem me convidou para uma viagem? - O ventilador que não parou de frente para mim, parece que não quer conversa. Acho que ficou de birra. Viro para o computador e começo a escrever esta história.

O ventilador que está às minhas costas, num balcão, continua mantendo o vento no ambiente. Posso senti-lo olhando por cima dos meus ombros, para ver o que estou escrevendo.

Em caixa alta escrevo que ELE ME CONVIDOU PARA UM PASSEIO, MAS DEPOIS REFUGOU, na esperança/vingança que ele esteja vendo.

Começo a perceber algum barulho estranho vindo dele. Seria só falta de lubrificação? Eu poderia jurar que ele estava falando na língua das cobras. A se eu tivesse de pronto a habilidade de um Harry Potter poderia entender e responder na mesma moeda ou mesma língua.

Começo a tentar ouvir como quem vê “aquele” livro 3D. Sei que daqui a pouco este barulho inteligível apresentará um padrão e eu conseguirei entender sua mensagem.

E começa a acontecer: a voz parece grave e parece me dizer:

-Hoje você conseguiu uma comunicação com um ser das... – Bom pessoal como é tarde vou ficando por aqui. Não gostei do “ser das “ e desliguei o ventilador (inclusive da tomada). Quem sabe escrevendo de manhã me venham devaneios menos sinistros. He he He. Já é tarde e precisamos dormir. Estamos no final do verão e à noite o ventilador já não é tão necessário assim.

Boa noite.

:)