Objetos moderninhos

Quando escolho um guarda-chuva automático, faço questão que a mola seja sempre bem forte. Mais rápido para abrir, mais resistente para permanecer aberto, com pose que quem é de boa qualidade. Sem dúvida, também, os de tamanho gigante para proteger melhor e, quem sabe, até me manter seca.

Imaginem a cena, dentro de um ônibus apinhado, bem literalmente, com as pessoas se encaixando umas nas outras, tal como uma pinha, para caberem dentro de um veículo construído para a metade do número de passageiros. Entra uma passageira (no caso eu) destrambelhada, cheia de sacolas, com seu precioso guarda-chuva automático enganchado de qualquer jeito entre os dedos. Vira daqui e vira dali e o objeto se abre sozinho, com toda a força que tem direito, o possante que é. Alguém empurra de um lado, outro tenta ajudar de outro. Raspa no rosto de um, cutuca a orelha do outro. Pânico das mães protegendo as criancinhas, alguns se abaixando para escapar das furadelas. Fechar? Nem pensar.... Com que mão para puxar com força o objeto que tem vida própria.

Só quem pega ônibus bem cheio pode fazer idéia do que seja lutar contra as forças das palavras que vinham de todos os lados e nem consegui captar a metade. A zoada foi tanta que desci pela mesma porta que entrei e fui curtir minha vergonha andando até outro ponto, não sem antes jogar na primeira lixeira aquele caro e especial objeto que mostrou quem manda.

Penso em voltar às velhas e boas capas de plástico, que rasgam na primeira levantada de braço.

Ana Toledo

( republicação de texto de abril/2010)

Ana Toledo
Enviado por Ana Toledo em 11/04/2018
Código do texto: T6305300
Classificação de conteúdo: seguro