CRISE NO CÉU

Hoje cedo em pleno sábado de feira livre na nossa cidade, saímos para tomar café. OPS! Feira livre? Se até o homem não é livre. Como podemos chamar de livre uma feira feita pelo HOMEM? Vamos adiantar esta parte, disso falaremos a posterior. Pois bem, decidimos tomar café fora para poupar o gás de cozinha; levamos as moedas contadas com a pretensa finalidade de não descontrolar o orçamento apertado.

No mesmo espaço está um senhor na idade da sabedoria, ao entrar o vejo, esboço um sorriso e lhes digo entres os lábios e um inclinar de cabeça - BOM DIA. Depois de alguns segundos percebo que ele me olha algumas vezes seguidas. E eu penso: "Deve ser a ousadia da legitimidade dos meus cabelos ..." e continuei a minha refeição matinal. Ele continuou a me olhar; sinceramente tratei de me aproximar mais do meu esposo, ali no mundo dele e da sua torrada. A situação piorou e muito; o senhor levantou e veio ao nosso encontro. Pensei: ... aliás nem deu tempo pensar. Ele, o senhor já estava apoiado à mesa e me olhava mais de perto. Como se estivesse me vendo interiormente.

É lógico que eu disse com mais clareza e de modo audível: "BOM DIA SENHOR!" Ele responde: "Bom dia minha senhora" A expressão minha senhora, não foi lá essas coisas... ele me pergunta: "A senhora é daqui?"

Respondi imediatamente: "SIM. E este aqui é o meu esposo!!"

A minha resposta, além de precipitada foi pecaminosa diante do que ele me acrescenta:" Isso eu já sei. Mas, cheguem mais perto e comam na presença um do outro. Sinta o sabor da torrada dele e permita que ele sinta o doce da sua salada de frutas... o mundo está em crise e ela começa em casa para depois chegar na rua. Veja ao redor, quantos casais estão aqui? Muitos e infelizmente poucos estão juntos.

Respirei apertado diante do que ouvia. E sabe, eu nem tinha dado conta que meu marido comia uma torrada. Estava muito mais ligada nos olhares incômodos daquele senhor, hoje eu aprendi que olhamos muito mais o que está distante e nos distanciamos de olhar e enxergar aqueles que estão perto.

Naquele momento olho para o senhor e digo:" Todos que estão aqui precisam ouvir o que o senhor nos disse." Ele sorrir e diz:" Fazem 10 anos que venho aqui todos os sábados e nunca ninguém me viu. SÓ VOCÊ!! Eu não existo para eles e olhe que muitos deles estão aqui todo santo sábado.

Fiquei curiosa e perguntei: "por que o senhor vem todos os sábados?" Ele me responde: "Para não me sentir só. Sinceramente, eu vi em vocês dois a minha vida no passado. Eu me casei em 58 quando tinha 15 anos, morei na Serra do Jatobá (...) e durante 20 anos de nossa vida de casados tomávamos café juntos na feira livre de Pau dos Ferros. Depois que ela foi morar no céu e esperar por mim lá, eu venho tomar meu café aqui nos dias de sábado... nunca nos permitimos fazer qualquer obrigação sem a presença do outro, mesmo se não estivéssemos perto estávamos juntos. Eu sempre sentia o sabor e o gosto da comida dela e sei que ela também sentia o gosto e o sabor da minha comida. Até hoje como tapioca com nata e canela, para sentir a voz dela dizendo: 'Simão, coma mais um pedacinho está com o gosto tão bom...' o interessante é que ela não tinha comido nem um pedaço, ela tinha alergia a canela."

Hoje na feira livre de Pau dos Ferros RN, mais parada que nunca, eu aprendi uma grande lição. "Alimentar-se junto é sentir o sabor do prato do outro, mesmo que se tenha alergia a algum alimento presente no prato."

Agradeci ao senhor Simão, ACHO QUE É ESSE O NOME DELE ou seria uma forma carinhosa de sua esposa chamá-lo? Ao agradecê-lo pela sabedoria compartilhada ele me diz: "Vejo em você algo diferente, uma sensação de paz, de paciência ... só leve um conselho, sinta o sabor do alimento do seu esposo e ele da mesma forma, porque lá na frente um ou outro vai precisar."

Seu Simão saiu andou alguns passos, lembrou algo que julgara importante dizer, deu a volta no corpo e acrescentou: "A sobremesa é a melhor parte, os dois devem comer no mesmo pirex porque no fim, só restará um e este lembrará da doce companhia do outro mesmo vivendo dias de amargura e solidão."

POR FAVOR: Não me perguntem as características físicas de seu "Simão", ele é um de muitos idosos que passam despercebidos pelas ruas das nossas cidades. E podem ter certeza que há muitos Simãos a nossa espera para ouvir um BOM DIA!

Depois de tudo olhei para seu "Simão" e disse uma frase que levo comigo ouvida algum dia: "O CÉU, NÃO ESTÁ EM CRISE. DEUS É QUEM NOS SUSTENTA E A MINHA FAMÍLIA CRER EM MILAGRES!" Ele esboça um sorriso, balança a cabeça, bate no peito esquerdo e ergue a mão para o alto.

ielandia jacinto
Enviado por ielandia jacinto em 07/06/2018
Reeditado em 07/06/2018
Código do texto: T6357672
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