Quanto vale o show?

Lembro-me de um quadro no Programa Silvio Santos há alguns anos chamado Quanto Vale o Show?

Pessoas de todos os lugares do Brasil apresentavam-se no palco trazendo ao público suas habilidades, às vezes nem tão hábeis assim, mas que tornavam as tardes de domingo da família brasileira muito mais aprazíveis.

Quanto Vale o Show? Essa era a pergunta.

Em um dia qualquer, de uma semana qualquer, em um bairro qualquer de uma grande capital, em um beco qualquer, um grupo de jovens divertiam-se numa animada roda de amigos. Não sei se estavam cabulando aula ou algo parecido, mas a verdade é que estavam ali se divertindo, passando o tempo, como alguns gostam de dizer.

As brincadeiras, no entanto, com o passar das horas, perderam o tom tranqüilo para tornarem-se cada vez mais mordazmente “apimentadas” entre um, depois dois e, finalmente, todos os integrantes do grupo.

Mentes libertárias poderiam alçar a bandeira da liberdade de viver e ser feliz e não encontrariam em mim oposição, não fosse por um pequeno detalhe: eram três rapazes e uma menina de nada mais que nove anos de idade. E que não se furtava de participar daquela cena; ao contrário, havia nela o gosto e o desejo de ser o pivô das satisfações eróticas daqueles rapazes.

Ainda mais gritante é o fato de estarem a cinqüenta metros de sua escola, às quatro horas da tarde num dia de semana.

A algazarra estava tão medonha que foi necessária a intervenção da polícia, chamada pela vizinhança indignada.

Muitos a esta altura estão chocados e também me perguntando se considero isto um show.

Na verdade considero isso um show, sim. Um show dos horrores de uma sociedade que não sabe mais quanto vale a si mesma.

Muitas são as questões que podem ser levantadas a partir de fatos como esse:

1. Onde está a família dessa menina?

2. Por que ela está ali, quando deveria estar dentro de uma sala de aula?

3. Que passa pela cabeça de três rapazes, quase adultos, sobre envolver-se com uma garota daquela idade?

Bem, não tenho dados muito aprofundados, mas posso dizer que a mãe é ladra de automóveis, o pai é traficante, a irmã mais velha, que tem idade de 13 anos, se prostitui em uma das avenidas da região Noroeste de Belo Horizonte. Uma garota de nove anos que já era conhecida dos policiais que foram atender o caso.

Os rapazes? Ah, sim, já, ia me esquecendo, são futuros pais precoces que, em nome do machismo maravilhoso de nossa terra, julgam-se no direito de usar qualquer membro do gênero feminino pra satisfazer seus instintos, como lhes é apregoado pelos quatro cantos da nossa tão iluminada mídia.

Não estou aqui pra trazer juízo de valor sobre essas pessoas, mas me preocupa muito ver que coisas como essa acontecem em todo tempo e lugar.

Indago-me sobre o futuro dessa garotinha. Que valores formam a base do caráter e da personalidade dela? Que estrutura pode ser usada para amparar e reparar (se ainda der tempo) essa menina que deveria estar brincando de boneca em casa ou estudando em um banco de escola?

Não tenho respostas, mas ficam no ar as perguntas: Quais valores estamos usando pra premiar o show da nossa existência? Quanto Vale o Show?