Já se passaram 57 anos...
    
            ...que estou no Brasil, eu só tinha 7 anos , faltavam dois meses para completar mais um aniversário.
            Daqui a uma semana serei um ano mais brasileiro, a pátria que me abraçou ainda menino, onde me casei e tive meus filhos.
            Este navio da foto é o "San Roque", que me trouxe, ele tinha a minha idade, era bem jovem e já navegando em mar aberto, como eu.
            Ainda hoje me jogam na cara quando opino sobre política, como se não tivesse o direito ( ?), e me pergunto ; " Será que um dia serei aceito por inteiro ?".
            Nunca me naturalizei, nunca quis renunciar as minhas raízes, pois são profundas demais para isso, mas isso é cultural, já que entendo ser parte de uma terra e não de uma bandeira.
           Levei a minha esposa para conhecer a minha gente, os lugares onde andei de criança, a casa onde nasci, para que se sentisse parte de tudo aquilo. Na praça encontramos um pau brasil com a placa dizendo ser daqui, e fiquei orgulhoso, pensei ...eu também !
            Entramos em um bar em Madrid e fazia muito calor, então pedimos uma cerveja "fria", como se diz para gelada,  que vem numa caneca generosa, então sem perceber comecei a falar em português com o dono do bar, e nisso os meus parentes questionaram aquele senhor...que disse ser português, e por isso estava me respondendo naturalmente. Todos acharam engraçado, e rimos...a ficha não caiu na hora !  As mulheres também tomam cerveja no balcão , até sozinhas, como os homens, ninguém acha esquisito.
             A minha esposa foi recebida como parte da família, só faltaram a carregar no colo, e quando perceberam que ela conversava bem em espanhol, gostaram ainda mais.
             Se passaram 57 anos, muito tempo, e nesse espaço enterrei meus pais nesta terra, juntinhos, como viveram durante 49 anos, e mesmo sendo um adulto já maduro, me senti orfão.
             Desprezo a xenofobia, e ela existe, a senti algumas vezes e sempre me doeu muito, pois sempre me pareceu injusta. A impressão que temos quando saímos de um lugar é que nunca na vida seremos de lugar algum.
            Fiz uma canção chamada " Barco Branco" , que está no Audio, à respeito deste navio da foto, onde as lembranças permanecem tão vivas quanto uma marca feita à ferro.
            Toco um violão acústico e canto , e foi muito difícil para mim, pois a emoção me tomava a cada vez que iniciava os primeiros acordes.


 


 
Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 13/10/2018
Reeditado em 13/10/2018
Código do texto: T6475232
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