Tarde de Sábado

Em frente à página em branco, os pensamentos se vão, o cansaço toma lugar à imaginação e o jeito é buscar o momento da palavra lá no fundo das lembranças.

Pois é; lembrança todos têm. Nem todas são possíveis de transcrever, mas todas são capazes de fazer sentir. Acredito que são elas, que por muitas vezes, nos remetem por instantes a lugares da infância, onde as cores, os cheiros e as descobertas eram realmente de entorpecer e aguçar a curiosidade.

Não importa onde se esteja, com quem se esteja, elas vêm como um resgate silencioso e eficaz da nossa solidão.

Quem numa tarde modorrenta, já não sentiu no toque da brisa a lembrança de uma tarde igual, ou no cheiro da terra molhada depois da chuva, o prazer indescritível de correr descalço?

É isso aí. A vida corrida, que tira o nosso tempo, que encurta nossos dias, que nos apressa a ponto de tirar nosso sono, ser-me-ia de todo insuportável sem a certeza destes pequenos lampejos de felicidade e poesia.

Disse nossa solidão? Peço desculpas: minha solidão, pois tenho como certo que cada um é dono da sua em particular.

Talvez esse seja o motivo pelo qual sempre me deixo acompanhar pela solidão de outrem, sem nunca adentrar na alheia, ou permitir que habitem a minha. Tais hipóteses a mim parecem insólitas.

Não me entendam mal, quando digo que as lembranças me resgatam da solidão, não acho de solidão seja ruim, mas ela é tão particular que só meus outros "eus" podem cirandar comigo.

A minha medida esta na medida da minha solidão, do meu silêncio, e nele se contem as lembranças, cheiros, gostos, fantasias, é um cantinho bem movimentado afinal.

Assim nessa tarde modorrenta de sábado, com o cheiro úmido do ar prenunciando a chuva, deixarei me levar por mim mesma, sem pressa, sem angústia, sem tempo.

Sabe o que mais: vou é pular amarelinha, brincar de roda, jogar queimada, ser feliz nem que seja só agora!