"As grades cibernéticas são pra trazer proteção?"

O jogo político que vem ilustrando o Brasil também ilustra o clichê diário de insistir em questionamentos como por exemplo, "o que está acontecendo?"; "Para aonde estamos indo" e por aí vai. Se tais dilemas girassem em torno, apenas, do que é especificamente "político" de nossas vidas, seria mais fácil. Não pelo nosso "político" pessoal ser definível e claro, mas sim por sua limitude (ou ilusão de limitude).

A questão é que vivemos política e não é como trocar de roupa no qual tiramos uma peça e estamos despidos de tal vestimenta: o político reverbera no pessoal, no subjetivo, no mais íntimo de nossos momentos. Tomar café da manhã é político; não tomar, também. Preferir almoçar alface com ovos cozidos ao churrasco e sua infinidade de proposições também político. Quando o suco natural é preterido pela coca-cola também é político... enfim, desde a macroestrutura às menores dimensões espaço-temporais do nosso comportamento, a política penetra mesmo quando não a vemos.

O "político" nosso de cada dia vai além de conceitos do que é ser de "direita" ou "esquerda", embora, parceladamente, também temos pedaços políticos referentes a estes. E tipo, tudo bem. Respirar política não é crime ou estaríamos todos sujeitos a uma reinvenção do nosso código penal. Mas socialmente, "cárceres" imaginários vem sendo construídos que demonizam a subjetividade - reflexo do concreto - política que todos possuímos e milimetricamente, em como nos comportamos, seja no mundo real e a priori, no virtual.

Existem, nas "esquinas" cibernéticas, algum "but" demonizando vossos fazeres diários de exercer política, embora também, sejamos francos, a politicagem. Se antes, a repressão acontecia sob tortura de milicos, agora o gatilho configura-se em um "tweet" ou um "comentário" raivoso em alguma das tantas redes sociais que vem surgindo. É a dualidade da era da internet: se ora temos liberdade, esta é cerceada por muros imaginários que se vão edificando no mundo cibernético. Não vemos, apenas sentimos.

Assim, o nosso ser "político" é moldado, não mais por leis e pelas práticas concretas do dia a dia - embora, tais contextos interfiram, mesmo que indiretamente, nos nossos atos políticos. O "fazer política" (e o dilema da renúncia e/ou omissão sobre determinados debates que eclodem a todo instante) possui como diretrizes de "exercer ou não", um reflexo do nosso imaginário que nos amedronta quando deliberamos fazer ou não fazer um "post"; comentário, curtida, "tweet", "rt" e por aí vai.

Como a política do nosso subjetivo é reflexo da política propriamente dita, não tem como fugirmos da equação de como esse aprisionamento de manifestações políticas na internet no contexto atual, sobretudo no Brasil: a "reinvenção" de um discurso conservador que permite um "fazer política" da negação política do outro.

Cheios de aspas, senãos, todavias, entretantos... Trazer à tona tal movimento reacionário que possui pouca materialidade diante de expressividade nas redes sociais é um papel constrangedor. Claro, antes de constrangedor, é ameaçador.

Fazer política sob o instrumento da escrita vem sendo como pisar em ovos e torcer que àquele ovo pisado não seja de uma serpente que possa ameaçar-lhe. Assim, apesar dos riscos, pisemos com força e exerçamos o nosso "fazer política" mesmo que possamos ser alvos. Sejamos "antídoto".

Ricardo Rayan
Enviado por Ricardo Rayan em 20/05/2019
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