O retrato da vitrine

Certa vez, ao passar pelo centro, da cidade, vi algo que me chamou a atenção. Era uma mulher, mendicante. Seus cabelos desgrenhados combinavam com sua roupa maltrapilha. Portava um saco, nas costas, no intuito de carregar o pouco que tinha.

Quando observei melhor, vi uma cena que jamais esquecerei A mulher tocou o vidro de uma loja e passou a olhar fixamente para uma boneca. Como quem desejava ardentemente aquele simples brinquedo. Naquele instante, confesso, eu baixei a cabeça e sai resignado pensando em muitas coisas. Meus olhos úmidos chegaram a fechar, também, conformados.

A sua idade avançada não fora um empecilho para sonhar. Mesmo estando numa das ruas mais movimentadas demonstrou força. Sacudiu a poeira do corpo e andou desajeitada em sentido inverso ao meu. Com certeza, notou o meu interesse em observá-la.

Todo o acontecimento deixou um pesar, duro, que me acompanha até hoje. Muito semelhante a um monólogo, de quem vê algo com desgosto e trata de esquecer o mais rapidamente. Sigo a descobrir novos rumos a cada esquina. Acho, sempre, um caminho diferente a olhar um desejo, que se encontra, logo atrás de uma vitrine.

Marcelo Luna
Enviado por Marcelo Luna em 25/09/2007
Reeditado em 26/09/2007
Código do texto: T668338