Oi, pai.

Oi, pai, tudo bem?

Espero que sim. Que tenha se livrado de todas as dores, de todas as amarguras da vida, de todas as más memórias.

Eu me lembro de coisas boas - algumas coisas boas, porque a maior parte das nossas vidas foi de sofrimento e de perdas. Foi de sonhos que nunca se realizaram, de possibilsidades que não se concretizaram.

Foi uma vida em que o não sempre venceu e que o riso ficou prá depois, prá depois, prá depois.

Como não podíamos te contradizer, contraargumentar e afirmarmos nossas ideias e tentativas de querer, briguei muito com você, pai, mas muito mesmo, em pensamento.

Hoje entendo que acabei te infernizando no além, mas o meu desejo não era esse. Longe disso! O meu desejo era te dizer que poderíamos ter sido felizes, eu queria te ver sem dor, sem martírio. Eu queria passear com você e não te ver sempre de pijama e tomando chá de erva doce. Eu queria te ver feliz, pai, ir a um show com você, passear pelo Bixiga, compartilhar curiosidades, conhecimentos, dúvidas... eu te queria, pai.

Hoje entendo quando você dizia que a vida passa depressa demais. Hoje já vivi 6 anos a mais que você. E sei que a vida passa depressa mesmo.

Eu te critiquei em pensamento porque não podia falar. As nossas bocas eram trancadas e não "podíamos inventar moda", lembra?

Mas eu quero te dizer: eu te amo, pai. Eu sempre quis dizer disso. Eu te queria perto, bonito, ouvinte e participante, não com pose de poder sobre o oxigênio dos filhos.

Desculpe pelas vezes que briguei em pensamento com você. Fique na paz, pai, sem nenhuma dor torturante e muito feliz.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 11/08/2019
Reeditado em 11/08/2019
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