O Vazio Eterno
Onde foi parar o amor? Aquele que nossos pais e avós assumiam para toda a vida? O tal do amor eterno, mesmo que eterno só enquanto dure como quis nosso poetinha camarada?
Na verdade para onde diabos foi a eternidade de nossos sentimentos, da amizade, da cumplicidade, do afeto?
Se der para perguntar por aí de porta em porta, se o tempo anda rápido demais, duvido quem negue ou deixe de reclamar que não há mais tempo para nada.
Mas o que mudou: a física ou o coração do homem?
Não sou física, portanto vou apostar na mudança do coração do homem, dizendo que hoje não somos mais “eternos”, assim deixamos de ser universais.
Hoje somos o momento.
E o momento tem de ser perfeito, pleno, temos de satisfazer nossas ansiedades, necessidades, tem que valer a pena constantemente, senão não se vive. Será? Tenho cá minhas dúvidas.
Lembro quando menina que meu avô, após o jantar, sentava-se como um pássaro repousando na varanda da casa de minha tia, enrolando um cigarro de palha, não dizia palavra, ficava em absoluto silêncio, absolutamente entretido com a simples e prosaica atividade.
Não criava nada, não discutia com ninguém, não chamava ninguém para lhe fazer companhia, permanecia em silêncio, terminava de enrolar o dito cigarro, dava longas tragadas, e, quando acabava olhava para o nada, respirava; ficava serenamente fazendo absolutamente nada.
Meu avô era dono do seu dia, e nele continha o universo, e neste cabiam momentos de absoluto vazio, e sua mente repousava, sua alma respirava sem perder ou ganhar nada.
Talvez, e só talvez, essa nossa ganância por ter o melhor companheiro, a melhor festa, o melhor momento, torne o tempo insuficiente, e a nós mesmos permanentemente insatisfeitos.
Não é possível, acredito eu, ter um casamento, um namoro, ou mesmo um amigo, baseando-se na troca. È comum ouvir de casais, ou amigos estremecidos a frase: eu investi muito e recebi pouco.
Investiu o que? Não é um mercado de ações, uma transação comercial, não se declara imposto de renda de sentimento.
A gratuidade do afeto, a serenidade da compaixão, a franqueza da solidariedade, fazem parte de princípios universais que permitem silenciar a nossa angústia pelo futuro, pelo amanhã.
Não é necessário temer a solidão, a falência, o desamparo se vivermos na sociedade que afirma estes princípios, pois eles admitem a imperfeição, a possibilidade do novo realmente novo.
Não importa quantas horas de trabalho, mas a real qualidade do trabalho, não importa o número de “eu te amo” dito pelo amante, mas certeza do sentimento.
O sucesso almejado a todo minuto, em todos os momentos, como um jogo que termina e recomeça a todo o momento, encurta o tempo e não permite que tenhamos os necessários momentos de vazio, de silêncio, onde nada é buscado ou desejado, onde descansamos.
Deste vazio surgiu o universo, e, é, deste vazio que surgem as idéias revolucionárias, o novo nunca tentado pelo simples fato de pararmos para descansar a nossa tão fatigada alma.
Talvez a felicidade não esteja na busca incessante pela satisfação plena, pelo momento perfeito, pelo sucesso, mas no silêncio, na aceitação da imperfeição e no reencontro dos princípios universais do amor, da solidariedade, da compaixão, que marcam o compasso do tempo sem temor algum do amanhã.
O ser universal, contém o seu dia, porque se permite saber seu começo meio e fim, sem se entediar e sem deixar de criar a sua própria humanidade e urbanidade.