Sobre Henry Sobel.

Impossível dormir nessa noite sem antes pedir uma bênção especial para o Rabino Henry Sobel. Um agradecimento autêntico, uma reflexão, uma análise da história. São muitas considerações a fazer.

A primeira vez que ouvi falar desse senhor respeitabilíssimo foi em 1975 quando do assassinato do jornalista Wladimir Herzog sob tortura na rua Tutóia, em São Paulo. E fui procurar saber um pouco mais a respeito da sua história de vida. E logo comecei a acompanhar os seus passos, o desenhar das tragédias que o tempo nos guarda. E eu ficava imaginando a sua mãe lhe carregando no ventre, fugindo dos nazistas a partir da Polônia ocupada e vindo a nascer numa Lisboa que não lhe dizia respeito. Saiu à procura da vida e fez com que a mesma pudesse florescer cá embaixo do Equador.

Adolescente na época e já muito interessada na história do meu país, fiquei fascinada pela honestidade, pela galhardia, pela presença daquele homem. A sua ousadia em anunciar ao país e ao mundo que a morte de Herzog era, de fato, um assassinato vil e não se tratava de suicídio como o oficialmente divulgado, fez com que milhares de vozes se erguessem contra o arbítrio, a selvageria legalizada e a boçalidade como conduta institucionalizada.

Sobel, os saudosos Dom Paulo Evaristo e o pastor presbiteriano D. Jaime Wright passaram então a se destacar como símbolos de luta pelo direito à vida, pela dignidade e pela justiça, ameaçando um fétido governo marcado pelo abuso, pela escuridão, pela invenção do pecado... aquele mesmo que esqueceu de inventar o perdão.

Naquela minha incompleta maioridade essas três pessoas, de competência ímpar, me fizeram apaixonar pelo direito, pelo respeito à existência com dignidade. Me chamaram a atenção para o valor da primavera, do perfume dos jasmins, dos manacás e dos girassóis.

Bem no momento em que a dor se mostrava irremediável.

Tempos dificílimos mas a sociedade começava a se movimentar para enfrentar o arbítrio.

A missa de sétimo dia pelo assassinato de Herzog foi um grande culto ecumênico realizado na catedral de São Paulo e lá estavam esses três humanistas à frente de uma multidão de mais de 8 mil pessoas, fora os que se concentravam na praça da Sé. Claro, disputando espaço com os milicos acompanhados dos seus cães que babavam para atacar os ditos subversivos.

Nunca mais deixei de acompanhar a trajetória dessas três pessoas, com admiração e respeito absoluto. Pessoas que propuseram o brilho da verdadeira existência nos tempos trevosos.

Eu me lembro de, tempos atrás, no casamento de uns amigos na Congregação Israelita Paulista, lá estava o Rabino realizando a cerimônia e o quanto me encantei em vê-lo de perto, como um símbolo de esperança e de retidão.

Sobel, o sr. não soube da minha existência e muito menos do meu respeito e consideração. Muito me orgulho de ter vivido parte da mesma história, de ter vibrado junto a favor da honra e do direito.

Obrigada, Rabino. Muito obrigada por tamanha coragem, vigor nas decisões, pela sua presença tão viva na mudança da história do meu país. País hoje em frangalhos.

Mas vou citar o meu querido D. Paulo. Está escrito na lápide onde ele repousa: Esperança gera esperança.

Siga em paz, Rabino. O país teve bons momentos de esperança e de vigor com a sua doce presença.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 22/11/2019
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