Memórias

Lavagem do Bonfim

Por volta dos meus 14 anos gostava muito das famosas festas de largo que começavam por Santa Bárbara no dia 4 de dezembro e terminava na Lavagem de Itapuã que se não me engano era uma semana antes do carnaval, algumas eu gostava outras não.

Em janeiro 1977 fomos eu meu irmão mais velho, minha cunhada e as primas dela que vinham de Muritiba interior da Bahia, como éramos muito jovens íamos a pé do Curuzu/Liberdade até a Colina Sagrada, onde morávamos era quase a metade do percurso cortando caminho pelo Largo do Tanque, saíamos na Calçada e seguíamos para o largo dos mares, parávamos um pouco pra observar o cortejo que começava com um chamado culto ecumênico criado pela LBV (Legião da Boa Vontade).

Em seguida as baianas vestidas de branco e seus filhos de santos e achegados que carregavam também as vassouras, com seus vasos de flores e água de cheiro para lavar as escadarias da igreja do Nosso Senhor do Bonfim pra variar participavam também os políticos o primeiro lógico sempre era Antônio Carlos Magalhães rodeados de baianas e puxa sacos.

Após a passagem das baianas viam as carroças enfeitadas, lindas com palhas de coqueiro e flores de papel de seda ou plástico achava lindíssimo as pessoas em cima vestidas de branco o contraste do colorido dos enfeites e o branco das roupas dos fiéis. nos dias de hoje esse cortejo não te mais carroças por conta de um candidato picareta retirou os animais do cortejo.

Entre carroças, batuques organizados todos de roupa branca, viam as bicicletas com seus aros enfeitados, também num colorido sem fim, vinham grupos de Afoxés e como não deveria deixar de ser o mais famoso Filhos de Gandhi .

Daí então nós seguíamos atras de alguma charanga ou batuque até a Colina o interessante que naquele tempo eram liberados trio elétricos e carros de som e quando chegamos no início da subida da ladeira devido a confusão de um trio me perdi do pessoal fiquei só, como sabia que eles iam até a porta da escadaria da igreja subi e fiquei esperando para ver se os via.

Me encostei em uma das árvores que não eram poucas na praça em frente a igreja, recentemente estive lá e com a grande reforma feita pelo atual prefeito ele retirou quase todas que ali existiam hoje só tem mais cimento e o que restou dos tamarineiros e palmeiras colonial dá pra contar a dedo, fazer o quê? É a modernidade! Voltando aos idos 1977.

De repente, houve uma briga numas daquelas nas barracas próximo onde eu me encostara haja bancos voando, homens trocando murros e garrafas de cerveja pareciam aladas me abaixei e esperei a poeira assentar, só melhorou com a chegada dos PMs metendo-lhe cassetete pra todo lado e em seguida prendendo os dois indivíduos causadores da desavença.

Nisso já passava das três da tarde um sol de verão de rachar, subi a outra ladeira em direção ao Mont Serrat, para pensar um pouco e tomar uma decisão já que não encontrei ninguém que tinha ido comigo, lembro que tinha o equivalente a uma passagem de ônibus no bolso, foi ai que resolvi voltar pelo mesmo trajeto da festa até o Largo do Tanque onde pegaria qualquer ônibus que subisse para a Liberdade caminharia até o Curuzu e finalmente estava em casa.

Como sempre fui muito observadora começei a notar o ambiente ao redor, algumas pessoas que estavam começando a chegar pois já passava das quatro da tarde ia ficando de tardinha, pessoas bêbadas as quedas, inclusive mulheres, crianças perdidas chorando sendo conduzidas pelos agentes do Juizado de Menores, eu quando os via me escondia para não ser apreendida, hoje em dia os menores andam livremente nas ruas sem uma abordagem, sem um pé de pessoa notar.

Mulheres em grupos faziam rodinha nos cantos e becos da rua para urinar e os homens pior do que cachorros encostavam em qualquer parede e mijavam. e eu continuava meu percurso, até quando cheguei a Calçada e vi ônibus chegando corri pra pegar só que cheios demais então resolvi ir para o Largo do Tanque, caminhei muito meus pés doíam dentro daquele tênis mal feito nada anatômico.

Avistei finalmente onde seria o meu percurso final e qual não foi minha surpresa ,esperança e ingenuidade de adolescente dos anos 70 os ônibus para qualquer direção estavam lotados já passava das seis horas da noite a noite caíra e sem outra alternativa subi a Ladeira do São Cristóvão, passei no topo pelo Colégio Abrigo dos Filhos do Povo e cheguei a Lima e Silva caminhei até o Curuzu.

Chegando lá meus amigos já sabiam e fizeram gozação com a minha cara porque eu havia me perdido, cheguei em casa mais do que cansada, acabada tomei água, mal comi e dormi até o outro dia meio-dia.

No outro dia ainda cansada decidi que não iria mais a essa festa. Até umas horas!!!!

Clara de Almeida
Enviado por Clara de Almeida em 16/01/2020
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