O INIMIGO ONIPRESENTE
Atualmente tenho desejado já estar em 2021 e olhar para trás e poder deixar essa pandemia tão falada, temida e gasta, mas presente.
Não se tem outro assunto, até porque não se tem mais vida. Ela limitou-se. Tiraram-nos o tal bem mais precioso. A liberdade tornou-se um objetivo ansiado e distante, ela que nos era tão corriqueira ontem mesmo.
Já se falou tudo sobre essa pandemia, que seria um castigo divino, um aviso para a humanidade, um pré-apocalipse, um fim para tudo, quando apenas queremos recomeçar todos os dias.
Mas perdoem-me se o que vou citar aqui agora soa um tanto quanto fútil e desnecessário nesse momento. Mas o que queremos agora é o prosaico de cada dia. Esse banal que se tornou uma raridade.
Então, eu queria de verdade poder escolher a cortina do meu quarto, onde o sol penetra todas as tardes e lembra-me que a loja está fechada, ou que a costureira está em recesso, caso eu queira inventar um modelo longamente idealizado.
Queria de verdade poder ir almoçar com a minha amiga Rô, tomarmos um vinho solene no início e um café descompromissado no fim. Tudo isso trocando ideias e esperanças sobre o mundo, como sempre fizemos desde 1980.
Gostaria de estar já em 2021 e que a linha do tempo do Facebook recordasse algum texto que fiz dando força aos meus seguidores, e saber que mentalmente eu acreditava que tudo iria terminar rápido, e quem sabe a mídia não estaria exagerando, como sempre?
Quero acreditar que em 2021 possamos olhar para trás e somar nossos ganhos, ínfimas perdas, profundos aprendizados, um eu melhor, mais rico e grato, pois, o corona vírus veio para nos lembrar da VIDA em letra maiúscula. Essa banal do ir e vir, do rir e chorar, do abraçar e beijar. Do nosso sagrado livre-arbítrio.
E acredito que veio para minimizar todas as nossas tragédias particulares, até porque o básico da vida está sendo suprimido.
E veio para nos lembrar da nossa imensa fragilidade e ao mesmo tempo da nossa incomensurável força, à qual nos coloca em alerta no escuro à espreita desse inimigo oculto, mas onipresente.
Então, as cortinas novas, os passeios e os almoços podem esperar, embora ansiá-los seja uma maneira irreverente e fútil; um modo de aliviar o atual momento.
Mas que tudo isso possa nos ensinar a ressignificar, palavra tão em voga, o nosso viver, e nos lembrar de como a liberdade sem medo é maravilhosa e salutar como uma brisa a nos tocar o rosto.