O DigitaDOR de Audiências

Trabalho há pouco mais de um ano numa Vara Cível Não-Especializada e dentre as tarefas que desenvolvo, a que me dá alguma satisfação, se é que se posso usar este termo, considerando o que de aprendizado extraio dela, é a de digitador de audiências; não pela digitação em si, obviamente, mas pelo que vivencio nas audiências.

O cenário é simples e sóbrio: uma sala ampla com sistema de ventilação central e boa iluminação; paredes sem qualquer ornamentação; uma mesa disposta em U e sete cadeiras para as partes (advogados e demandantes); quatro outras ficam disponíveis para o público, em geral, alunos de Direito desenvolvendo trabalhos do curso; um Vade Mecum atualizado; um computador com impressora; uma cadeira de encosto mais alto, que identifica o Locus nada amenus do juiz e a minha ao seu lado, nada mais. Se o cenário é franciscano, não o são as disputas em questão. Os dramas do cotidiano são de diferentes matizes, de complexidades variadas e atingem todas as classes sociais. Ricos disputam com ricos, ricos demandam com pobres, pobres se digladiam contra pobres e os remediados também buscam remédios para seus males.

As teses de acusação e de defesa são defendidas a ferro e fogo por cada um dos advogados das partes, cada qual munido de documentos e da arma mais poderosa, a eloqüência. Os mais experientes geralmente devoram os neófitos na profissão. Manhas, macetes, manobras, pirotecnia, de tudo se utilizam para convencimento do juiz. Nas audiências, principalmente nas de instrução, vê-se e ouve-se de tudo. Já vi marmanjos chorarem (instruídos ou não), já vi senhoras de suave semblante, virarem uma fera, outras se enrubecerem com relatos. Enfim, é possível captar um turbilhão se sentimentos e emoções, que vai desde a frieza bem medida à exasperação inesperada. Por que brigam? Geralmente a motivação, na vara em que atuo, é o dinheiro ou bens materiais diversos. Ouvindo tantos casos concretos, entendi a frase, de cujo autor não me recordo, mas que diz mais ou menos assim: "Com o fito de subir, a que ponto não se baixa o ser humano". Ou outra, que diz: "Com os livros aprendi a fugir do mal sem dele provar. Nas audiências, é assim, tenho aprendido a memanter longer do mal, sem dele ter que provar.

Marcos Cavalcanti
Enviado por Marcos Cavalcanti em 16/10/2007
Código do texto: T696302
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