O QUE LHE DER NA TELHA
Ela só quer falar sobre banalidades; coisas assim que ninguém está interessado, ainda mais nesses tempos de pandemia, de vida cara e de perdas imensuráveis. Mas ela quer falar do prosaico tão corriqueiro na sua escrita.
Desse momento de lavar as panelas ouvindo Marvin Gaye no Spotify e dançar até esquecer os problemas. Assim, problemas graves, de incertezas, de escuridão no final do túnel mesmo. E ela quer falar de margaridas na janela, de brisa no amanhecer e de sonhar de novo com os pés no mar.
Ela só quer dançar “Dancing Queen” do Abba, até porque ela é meio obsoleta e se permite ser brega ao cubo. E também assistir programas de humor singelo e dar gargalhadas com o Chaves.
Quer tomar café olhando para aquela rua para a qual não pode caminhar mais. Aguar os cactos da janela, até porque eles a ensinam todos os dias sobre a famosa resiliência ou resistência para ser mais exato.
Ela só quer comer aos domingos macarrão ao sugo com bastante queijo e beber o seu vinho barato, mas de gosto bom. Sorrir para a vida que se tornou bem madrasta para ser clichê.
E ela só quer escrever o que lhe der na telha, na veia, na raiva ou no amor. E só quer andar descalça dentro de casa porque isso remete às férias de verão. Ela só quer vagabundear para ser mais exata, porque de sério já basta esse momento." (crônica incompleta)