Um dia no mundo capitalista.

Ainda ontem comprei um lenço. Um lenço branco, macio e cheiroso com o qual enxuguei minhas lágrimas que regam as retinas já maltratadas pela vida moderna e amarga pelo tempo selvagem.

Uma vida com a minha que nasce como um rio, que cresce como um rio, e que morre como um ser explorado acabado e enterrado pelo capitalismo. Saí da loja ainda pensando nesse modo de vida e com os olhos rasos d’ água e assim caminhei para casa.

No caminho encontrei um menino magrelo e amarelo, usando bermuda e andando descalço pelo asfalto escaldante. Um menino como outro qualquer, que aparentava não ter treze anos de idade. Um menino como outro qualquer, que não aparenta ter treze anos de idade.

Esse menino magrelo e amarelo trazia colado ao peito uma caixa de papelão cheia de chocolates:

_Tio compra um e me ajuda, por favor!

Aquela pequena voz soou grande em meus ouvidos. Fiquei parado a sua frente sem dizer uma só palavra. Eu estava perplexo pó não encontrar nenhum motivo para dizer não. Então sem ter o que falar enfiei a mão no bolso e retirei o troco da compra do lenço e levei para casa alguns chocolates.

Comprei não para ajudar aquele menino necessitado, mas sim pela recompensa do seu esforço derramado em seu ofício de vendedor.

Aquele menino magrelo e amarelo deveria estar na escola capitalista sendo adestrado para obedecer a seu superior. Daí se vê que nem todas as pessoas são realmente pessoas, pois umas são sempre mais que as outras.

Enfiei os chocolates no bolso e segui adiante. Mais à frente ainda pensando no menino magrelo e amarelo encontrei um falecido. Um falecido como qualquer outro falecido. Uma roda de curiosos estava diante do corpo. Alguns diziam que ele, o falecido, rondava por ali já alguns dias. Outros diziam que a polícia agiu certo. Algumas enamoravam o silêncio.

Finalmente cheguei em casa e fiquei a noite interira olhando as luzes dos apartamentos acesas. Apartamento de gente que se acha como a maioria de toda essa gente magra e amarela. A alta noite teceu uma madrugada serena e calma, e por sua vez, a madrugada teceu uma manhã ensolarada e bonita.

Como de costume, mais ou menos sete horas, chegou o jornal e logo na primeira página, assim de cara a manchete era:

MENINO QUE EVNDIA CHOCOLATE NA RUA ENCONTRA SEU PAI MORTO PELA POLÍCIA EM UM ASSATO A BANCO.

Meus olhos declamavam as lágrimas. Mas desta vez decidi não sair de casa para comprar um lenço...um lenço branco, macio e cheiroso. Não quiz desfrutar dos ares sombrios das ruas capitalistas. Antes eu nem tivesse nascido nesse mundo selvagem.