Domingo

Ah! o domingo. Não sei dizer qual o sentimento que me vem quando penso nesse dia. São vários. Nostalgia, depressão, alegria porque amanhã é segunda. Sim, porque, ao contrário de muita gente, eu adoro as segundas-feiras. Porque adoro o meu trabalho e segunda a Bando está lá, linda, à espera da sua revisora. Durante a pandemia tem sido diferente, eu gosto de toda a agitação de uma agência de publicidade, todo mundo falando, fazendo brainstorm, risadas, e eu no meu canto, ouvindo tudo, absorvendo, memorizando e, claro, aprendendo muito. Eu adoro saber. Fico invocada com a capacidade dos redatores criarem aqueles textos curtos e impactantes, eu escrevo um livro mas não dou conta de fazer um negócio desses. Essa criatividade que eles têm. Quem sabe, um dia, eu, deitada numa rede, pensaria nisso. Mas com prazo? Não rola. Por isso o meu fazer é revisar porque, modéstia à parte, meu português é muito bom. Fruto do meu vício de leitora contumaz.  Às vezes faço perguntas aos diretores de arte, como uma vez pedi para a Lígia me mostrar as cores no programa de computador e ela me mostrou um monte de números. Fiquei injuriada. Uma sequência numérica? Como assim, Bial? Azul celeste, azul marinho, azul bebê, azul turquesa, todas essas palavras lindas codificadas em números? Sacrilégio. E ela deu risada. Domingo parece um dia feito para lembrar as coisas boas. Como as madrugadas parece que foram feitas para lembrar das coisas ruins. Acordar de madrugada me mata. Ainda bem que isso quase nunca acontece.
Apois. Os domingos. O que eu faço. Agora vou começar a reler São Bernardo, do Graciliano Ramos. De manhã eu lavei roupa, já assisti a dois filmes (Você nem Imagina, Felicidade por um Fio) e, às dezoito horas, tem a live da Simone que eu não perco. Então vem a noite de domingo que é a hora mais chata do mundo e eu, para me distrair, arrumo a casa, lavo as roupas coloridas que deixei de molho de manhã e, depois de tudo, tomo meu remédio para dormir. Mas cadê que eu durmo. Horas e horas acordada. Tenho quatro gatos, até eles dormem. E são animais crepusculares pra noturnos. E eu acordada.
Domingo nostalgia é quando me lembro da minha infância. De manhã, a mãe fazia bruaca (humm) e arrumava a Vanda e eu para irmos à missa. Quando chegávamos, outra rodada de bruaca. Na hora do almoço, o frango cozido com coentro e cebolinha que só a mãe sabe fazer. O pai ligava o rádio no programa "Nós na Fossa" (eu pensava que a 'fossa' era literal) e eu aprendia as músicas que fizeram de mim essa romântica invurável.

" Cabocla, seu olhar está me dizendo
Que você está me querendo
Que você gOosta de mim..."

Ai, quase que eu me esqueço; é que essa memória é bem antes, quando eu tinha uns três anos. Acordava ouvindo Roberto Carlos.

"Eu sei, ei, ei
Vou correndo ao encontro dela
Coração tá disparado
Mas eu ando com cuidado
Não me arrisco na banguela..."

e eu imaginava logo uma mulher sem dentes. Até hoje estou por saber o que é a banguela do Roberto.
Vindo um pouco mais pra frente, os domingos no convento. Essa parte eu pulo. Vamos para outra, melhor: quando morávamos na Maraponga, no apartamento da Vanda. De manhã, ela fazia a divisão de tarefas: Thiago varre, Vera passa o pano, Vanda cozinha, quem comer por último lava a louça. Depois eles iam assistir Game of Thrones e eu ia ler.
Hoje estou sozinha. Nem tanto porque tenho três gatos. Mas é diferente, sem horários, só faço a comida quando estou com muita fome, fumo dentro de casa, rsrs, não sou de decorar, de arrumar, de alisar móveis, aliás, eu nem os tenho. Um amigo meu, o Loan, comprou um conjunto de louça pra casa nova dele, tudo combinando. Eu tenho uma cumbuca que serve de prato, uma xícara que serve de copo, um talher de cada... Oxe, pra que mais? Mas quando passo em frente a uma livraria, olho para o outro lado. Gente, aquilo pra mim é o paraíso.
Prometo voltar mais vezes para prosear com vocês. Passei mais de um ano sem escrever aqui. Nesse intervalo tive um texto publicado no Prêmio de Literatura Unifor. Tentei interagir nas redes sociais mas nada como o nosso Recanto, onde escrevemos o que queremos, quando queremos.
Srta Vera
Enviado por Srta Vera em 23/08/2020
Reeditado em 23/08/2020
Código do texto: T7044242
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