A Pulseira de Prata
Uma vez, quando a Vanda e eu éramos pequenas, ela achou uma pulseira de prata no meio da rua. Era uma coisa linda aos meus olhos de criança. Quando as coisas, e as pessoas, são de verdade, elas têm algo em torno de si que é muito atraente. Uma joia, uma pessoa do bem (não de bem), a natureza, os bichos, uma obra de arte.
A Vanda usou a pulseira uns dias e terminou por vendê-la a um caminhoneiro que, esperto como ele, pagou uma ninharia. Tão fácil enganar uma criança. Nós morávamos perto de um posto de gasolina às margens da BR 020, por onde passava muita gente, romeiros indo a Canindé em paus-de-arara, carretas de algodão, aqueles caminhões-tanque de gasolina, muita gente mesmo.
Hoje, do alto dos meus 41 anos, vejo, com os olhos da memória, a menina que eu fui, naquele tempo, vendendo broa aos romeiros. E imagino como seria fácil para um daqueles caminhoneiros me ludibriar e me levar embora na boleia do seu caminhão. Quantos perigos passaram por aquela via?
A mãe diz que naquele tempo não havia pedófilos, estupradores, assassinos de crianças. Ora, ela me mandava ir sozinha, pelos caminhos absolutamente ermos do Sertão, buscar manga na casa da tia Marieta. Quantas vezes eu senti, no meio do matagal, olhos me fitando? Mas eu era criança. Eu era pura. Acreditava em criaturas fantásticas, caiporas, mães d'água, não sabia o que era o Mal. Dizem que existe um anjo da guarda que protege as crianças dos males desse mundo. Deus, cadê esse anjo? Morreu de velho? Foi demitido e o seu cargo extinto? Porque é horrível demais, Senhor, o que está acontecendo com as nossas crianças. É inadmissível um bispo afirmar que uma criança de dez anos cometeu um crime hediondo ao abortar um feto gerado mediante estupro. Seu bispo, dez anos. Os estupros começaram aos seis. Sabe como é o corpo de uma criança de seis anos? É tão pequenininho. É tão frágil. É tão revoltante existirem pessoas como você e aqueles "cidadãos de bem" que fizeram toda aquele baderna no hospital andarem por aí sem que lhes caia um raio na cabeça e os reduza a cinzas. Hipócritas. Será a vocês que Jesus dirá, quando chegar o dia do julgamento: "nunca vos conheci, afastai-vos de mim."
A Vanda usou a pulseira uns dias e terminou por vendê-la a um caminhoneiro que, esperto como ele, pagou uma ninharia. Tão fácil enganar uma criança. Nós morávamos perto de um posto de gasolina às margens da BR 020, por onde passava muita gente, romeiros indo a Canindé em paus-de-arara, carretas de algodão, aqueles caminhões-tanque de gasolina, muita gente mesmo.
Hoje, do alto dos meus 41 anos, vejo, com os olhos da memória, a menina que eu fui, naquele tempo, vendendo broa aos romeiros. E imagino como seria fácil para um daqueles caminhoneiros me ludibriar e me levar embora na boleia do seu caminhão. Quantos perigos passaram por aquela via?
A mãe diz que naquele tempo não havia pedófilos, estupradores, assassinos de crianças. Ora, ela me mandava ir sozinha, pelos caminhos absolutamente ermos do Sertão, buscar manga na casa da tia Marieta. Quantas vezes eu senti, no meio do matagal, olhos me fitando? Mas eu era criança. Eu era pura. Acreditava em criaturas fantásticas, caiporas, mães d'água, não sabia o que era o Mal. Dizem que existe um anjo da guarda que protege as crianças dos males desse mundo. Deus, cadê esse anjo? Morreu de velho? Foi demitido e o seu cargo extinto? Porque é horrível demais, Senhor, o que está acontecendo com as nossas crianças. É inadmissível um bispo afirmar que uma criança de dez anos cometeu um crime hediondo ao abortar um feto gerado mediante estupro. Seu bispo, dez anos. Os estupros começaram aos seis. Sabe como é o corpo de uma criança de seis anos? É tão pequenininho. É tão frágil. É tão revoltante existirem pessoas como você e aqueles "cidadãos de bem" que fizeram toda aquele baderna no hospital andarem por aí sem que lhes caia um raio na cabeça e os reduza a cinzas. Hipócritas. Será a vocês que Jesus dirá, quando chegar o dia do julgamento: "nunca vos conheci, afastai-vos de mim."