A função da arte

Certa vez Guimaraes Rosa afirmou que o importante e bonito do mundo é que as pessoas nao foram terminadas, nao sao sempre iguais, que elas vao afinando e desafinando, ou seja , elas vao mudando.Acho que é isso que vai nos ensinando a levantar todos todos os dias, apesar da insônia de todas as noites.Tenho conhecido pessoas imaginárias, sim, imaginárias, porque sao anônimas, protegidas pela virtualidade, entretanto desvendam uma humanidade que só a alma, em seu silêncio percebe.As letras livram-se dos olhos , estáticas elas podem dizer e silenciosas podem remexer em outra alma, sem pudor algum.

Gosto de ler estes silenciosos poetas da rede.Aprendo que algo nos assemelha , o nao estarmos terminados, o desafino dentro dos dias e as emoçoes, e ainda assim uma sensaçao de primeira vez, tanto na dor quanto na alegria.Damos os mesmos nomes às mesmas coisas, cada qual entretanto, com sua propria claridade ou escuridao.Quando escritas as cicatrizes nao fecham nem desaparecem, estao sempre abertas, escancaradas, suspensas e atemporais, mas nunca um de ja vu.

Se houve um tempo de escrever, hoje vivo um tempo de reler, é visitando o coraçao dos outros que posso reconhecer os espaços profundos onde vive o meu.Tenho que interpretar cada palavra , é meu exercício desvendar essa vida nao terminada, se fazendo, crescendo, vicejando de tantas formas diferentes.

Descobri que sou um voyer de palavras, pois ao observá-las tomo conhecimento daquelas que nao digo, e que ditas por outros, reverberam, criam ressonâncias, ecoam para além da solidão de cada um de nós.

A função da arte é esta.Multiplicar a leitura da realidade.

Ana Montenegro
Enviado por Ana Montenegro em 25/10/2007
Código do texto: T708746
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