A DAMA DA NOITE

Ronaldo José de Almeida

Logo após o almoço, ouviu-se o barulho característico de um carro á parar. Em seguida a buzina tocou duas vezes. Jurema a fiel empregada de dona Albânia enxugou as mãos no avental e foi ver quem chamava.

Voltou rapidamente e foi até o quarto da patroa chamando-a.

Dona Albânia, levantou-se contrariada e reclamou de Jurema: - Já lhe disse para não me acordar, sabe que meu sono é sagrado, mas você não tem jeito, não me escuta.

- Mas dona Albânia é o seu Elpídio que chegou com uma menina linda, a senhora vai gostar de ver. respondeu a empregada.

- Muito bem, manda entrar e sirva um café ou suco, logo eu irei.

Jurema mandou que entrassem, serviu um pequeno lanche para o motorista Elpídio e a moça que o acompanhava.

Dona Albânia apareceu em seguida e encantou-se com a moça:

-Como vai Elpídio? Quem é esta menina linda?

- Dona Albânia esta moça é a Patrícia, ela se “perdeu” com o filho de um rico fazendeiro, e os pais dela a expulsaram de casa. Se a senhora interessar podemos conversar.

- Venha cá minha filha, quantos anos você tem? Indagou dona Albânia.

- Tenho 14 anos, faço 15 na semana que vem dia 22.

Aos quinze anos, linda, corpo escultural, reluzentes olhos azuis e cabelos louros e cacheados, Patrícia parecia uma boneca. A esperta cafetina, imediatamente viu na menina a grande fonte de renda.

- Você explicou para ela como é a função aqui na minha casa, Elpídio? Perguntou dona Albânia.

- Só falei o necessário, ela sabe do que se trata, não está enganada, o resto à senhora explica, eu não sei falar essas coisas. Respondeu Elpídio.

Dona Albânia alojou Patrícia num bom quarto, acertou financeiramente com Elpídio e mais tarde conversou longamente com a menina, deu-lhe muitas informações a respeito da nova vida.

A noite Patrícia não saiu do quarto por ordem da cafetina, ela iria fazer sua estréia na sexta-feira, não podendo aparecer no salão para não quebrar o impacto.

Contentou-se em espreitar o movimento de longe, pela fenda de uma porta, a menina ficou encantada com o que viu, as luzes multicoloridas, as mulheres com roupas extravagantes, a música, o vai-e-vem dos garçons e clientes, tudo a deixava alucinada.

Ela notou um rapaz elegantemente vestido, de boa estatura e que falava com todas as mulheres e demais pessoas do salão, a todos tratava bem. De imediato gostou do rapaz e perguntou a Celina, uma das empregadas da casa quem era aquele simpático freqüentador.

- Aquele é um político muito conhecido, Patrícia, freqüenta a casa todas as noites, é gente boa, muito rico.

Finalmente chegou o dia da estréia da menina Patrícia, ela estava eufórica para ir para o salão. Dona Albânia, passou a tarde toda telefonando para os clientes especiais, informando sobre a menina que iria estrear.

Há hora marcada o salão estava cheio, as mesas abastecidas de bebidas caras, o porteiro autorizado a só permitir a entrada de pessoas convidadas.

De repente a música parou, o locutor informou a entrada de Patrícia ao salão, o conjunto deu os acordes de uma música lenta e compassadamente a menina foi introduzida ao salão, causando furor e êxtase aos homens.

Realmente a garota estava radiante, poderia ser qualificada como a oitava maravilha do mundo, os homens freqüentadores do salão estavam em total estado de desejo sexual.

A menina desfilou entre as mesas causando admiração e levando os homens a loucura, indo em seguida em direção a cafetina que lhe tomou a mão.

- Meus amigos, atenção, por favor, esta é a Patrícia, como vocês vêm é uma criatura linda e tem somente 15 anos. Em trinta minutos darei inicio ao sorteio, quem ainda não adquiriu o bilhete que o faça logo, o prêmio, esta coisa linda que vocês viram, está louquinha para ser sorteada. falou dona Albânia.

O burburinho era geral, da sua mesa juntamente com a cafetina, Patrícia corria a vista procurando o político que vira na noite anterior. Localizou-o numa mesa no canto do salão com dois amigos e uma linda morena no seu colo.

A menina sentiu ciúmes, ela mesma achou estranho tal sentimento, afinal nem conhecia o senhor.

Pouco depois dona Albânia iniciou o sorteio, para se ter a idéia do preço do bilhete, este se equivalia a dois salários mínimos, foram vendidos 65 bilhetes. A cafetina estava satisfeita com o êxito do empreendimento.

Para despertar mais interesse, optou-se pelo método de eliminação, cada nome eliminado era seguido por gritos, alguns jogavam o copo com bebida para cima, sendo logo contido pelos amigos e ou seguranças da casa que lhes acalmavam os ânimos.

A menina acompanhava atentamente a eliminação dos participantes, em silêncio torcia pelo político, também tinha notado um jovem jornalista que se fazia acompanhar de dois senhores bem mais velhos, caso este fosse sorteado, também fazia gosto.

Restando somente cinco pessoas, as outras eliminadas começaram a fazer torcida para os finalistas, a garota prêmio, estava impaciente para ver o resultado, entre os últimos estavam o político e o jornalista.

Finalmente chegou ao final o sorteio com o político sendo o vencedor e alvo de inveja de todos os homens presentes.

Ao ser chamado para receber o prêmio o político não se conteve e beijou ardentemente a menina, foi amor à primeira vista.

Em seguida saíram e foram jantar no melhor restaurante da cidade, ao entrarem de braços dados logicamente foram alvos de todos os olhares. O político encheu-se de orgulho, sorria abobalhado.

Durante muitos meses o casal viveu um clima de total felicidade e lua-de-mel, o político a cobria de gentilezas e presentes caríssimos.

Os encontros se davam sempre à noite, os amantes ocupavam uma mesa discreta no canto do salão, permaneciam ali por um tempo e depois se recolhiam ao quarto. Quase ao amanhecer o rapaz ia embora.

Durante muito tempo os encontros foram coordenados desta forma, ou seja, sempre à noite, assim a menina tinha o dia completamente livre.

Por varias vezes quando em companhia do político, Patrícia sentia o olhar do jovem jornalista sobre si, e sorrindo disfarçadamente correspondia.

Certo dia, no horário de almoço, a menina recebeu a visita deste rapaz e não conseguiu esconder a sua satisfação, sorria muito. Conversaram durante algum tempo, sob o olhar analisador de dona Albânia.

De repente Patrícia levantou-se e puxando o jornalista pelo abraço o levou para o quarto, ali permanecendo até o final do dia, quando então o rapaz foi embora, despedindo-se da moça com um longo e apaixonado beijo.

Assim que o rapaz saiu à cafetina repreendeu severamente a menina, não aceitava o jogo duplo que se iniciava.

Para surpresa da dona do cabaré, a garota se rebelou e disse que daquele dia em diante receberia homens de dia, principalmente o jornalista, este sim por amor, pois gostava dele.

Dito e feito, durante o dia Patrícia tinha uma clientela selecionada, entre tais pessoas incluía-se o jornalista.

Patrícia às vezes saia de dia com o rapaz do jornal, até em festas de clubes ele a levou, fato que chegou ao conhecimento do político que teve que relevar para não perder a garota.

O relacionamento entre a garota e o político já desgastado pelas aventuras da menina, acabou chegando ao fim. Devido a sua beleza Patrícia passou de mão em mão entre os poderosos da cidade.

A menina viajou muito, esteve em várias cidades do Brasil, retornando a casa de dona Albânia alguns anos depois, já bem madura, não ostentando mais a beleza da juventude.

Com o passar do tempo dona Albânia fechou seu cabaré.

Patrícia hoje é vista mendigando pelas ruas da cidade, dorme sob uma marquise onde fez morada, quem a conheceu dificilmente a reconhecerá, nada traz da dama-da-noite que um dia foi, a não ser os grandes olhos azuis.

Certo dia, já no cair da tarde, o jornalista estava sentado a uma mesa de bar, na calçada de uma rua sem trânsito de automóvel, conversava e bebia cerveja com alguns amigos. De repente Patrícia aproximou-se timidamente e o chamou pelo nome, pediu uma esmola.

O jornalista ao vê-la, negou a esmola e ainda contrariado com o fato dela o chamar pelo nome, o que denotava conhecê-lo, resmungou impropérios.

A antiga dama-da-noite abaixou a cabeça e foi embora.

São as voltas que o mundo dá.

RONALDO JOSÉ DE ALMEIDA
Enviado por RONALDO JOSÉ DE ALMEIDA em 27/10/2007
Reeditado em 18/12/2007
Código do texto: T712618
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