Os barbeiros e uma história para contar

No século XVIII, os barbeiros eram profissionais que viajavam pelas províncias oferecendo seus serviços que incluíam corte de cabelo, sangrias, benzeduras e venda de raízes, dentre outras coisas. Como sujeitos em trânsito, os barbeiros levavam histórias, causos e acontecimentos muito variados, vividos por eles nas localidades

Os barbeiros eram pessoas extremamente interessantes, pois, além do serviço de barbearia, eles também praticavam o comércio, o escambo e toda sorte de serviços rápidos demandados pelas comunidades, incluindo algumas práticas de cura. Antes de 1808, muitas pessoas resolviam seus problemas de saúde recorrendo a boticários, cirurgiões-barbeiros, barbeiros, sangradores e curandeiros.

O barbeiro, além de cortar e pentear os cabelos e barbear, alugava sanguessugas para os médicos-cirurgiões e clientes, fazia curativos e operações cirúrgicas pouco importantes. Por terem grande habilidade manual, os barbeiros faziam também extrações dentárias porque à época ainda não existia a odontologia e muitos cirurgiões (na maior parte, cirurgiões práticos) não intervinham na boca das pessoas, por receio ou por desconhecimento de que isso seria possível.

Podemos ver ainda vestígios dessa prática na Barbearia do Saraiva, em Pedro Leopoldo. Lá estão reunidos os serviços de barbearia, o comércio e a benzedura, três dentre as principais práticas dos barbeiros dos oitocentos. Os novos tempos trouxeram à barbearia do Saraiva as infindáveis conversas sobre futebol e política, além de outras variedades.

A barbearia, assim organizada, faz lembrar das barbearias antigas e traz ao presente alguns vestígios de um passado no qual os médicos não possuíam a autoridade conquistada na atualidade. A higiene era praticada com outros parâmetros que os da atualidade, e pensemos apenas a título de exemplo que as descobertas de Pasteur somente seriam incorporadas às práticas sociais no início do século XX.

Com os barbeiros, era possível encontrar emplastos e ungüentos contra febre, mal olhado, quebranto, espinhela caída etc. Os barbeiros eram, portanto, pessoas de referência, conselheiros sociais, além de profissionais envolvidos com a solução de problemas de saúde do espírito e do corpo.

Na barbearia da atualidade, ainda encontramos benzedura contra quebranto, cobreiro, queda de cabelo, além de loterias, cadarços de tênis, cartões telefônicos e santinhos de política.

Está presente também o glorioso galo atleticano numa estampa de parede e os jornais de circulação local e regional.

E estão reunidas três gerações de competentes barbeiros, além de oferta de serviços diferenciados, quase que uma divisão do trabalho entre pais, filhos e neto.

Tudo isso nos mostra que os barbeiros são pessoas de seu tempo, embora esse tipo de barbearia conserve ares ancestrais.

Por aquela barbearia passaram diversas gerações de homens (e também mulheres!) à busca de um bom corte de cabelo, boa conversa e ajuda para as suas aflições, dúvidas e males.

Valorizemos esses espaços de cultura, entendendo todo o seu significado histórico, social e cultural.

Publicado originalmente no Jornal Aqui, maio de 2006. Direitos autorais reservados.

Júnia Sales
Enviado por Júnia Sales em 30/10/2007
Reeditado em 10/11/2007
Código do texto: T715897
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