"MÃOS AO ALTO!"

A meninada, que assistíamos nos cinemas aos banguebangues das matinês de domingo, nos idos de 1.950, 1.960, era fã de Allan Lane, ou Allan “Rocky” Lane ou simplesmente Rocky Lane, e vibrava com ele. Ele era o mocinho: todo vestido de cinza, chapéu e botas também cinzas, cinturão com dois coldres, sacava seus Colts com rapidez incrível e atirava certeiro. Falo do Rocky Lane nesta “estorinha”, não desse, mas de um outro.

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Nas cidadezinhas do interior paulista, por aquela época, também aos domingos, mas de manhã, era comum que rapazes se reunissem nos campinhos de futebol para um muito animado “bate-bola”, antes das cervejinhas. O jogo não tinha hora marcada para começar: quando vinte e dois se reunissem, começava; com 4 gols virava e com 8 acabava, de tal sorte que a hora de acabar era mais incerta ainda. Durante o processo de reunião dos jogadores, ia-se ajuntando uma plateia. Começado o jogo, as pessoas gritavam, aplaudiam, faziam gozações... Tudo era uma uma bonita “festa do interior” — alegre, mesmo as gozações. “Os tempos eram outros”.

Guararapes, quase na rabeira da zona Noroeste, a pouco mais de quinhentos quilômetros da capital, São Paulo, pela rodovia “Marechal Rondon”, é dessas cidadezinhas. À época, com pouco mais de vinte mil habitantes; hoje, trinta e três, mais ou menos. Seu “campo de futebol” era o Estádio Municipal “Adelmo Almeida”. O estádio era grande, cercado por um muro de tijolos bastante alto. Sua frente para a rua “Armando Sales de Oliveira”; à direita, a rua Seis de Junho; à esquerda, a “Adelmo Almeida”; aos fundos, o campo de Basebol. Cercavam-no, também, pelas laterais, duas fileiras de eucaliptos bem formados que, em dias de chuva, exalavam um aroma de embriagar.

O torcedor que entrasse pela frente, depois de passar pela portaria, dava de cara com uma figueira enorme. Ela, que não sei se ainda existe, era um “patrimônio” do estádio e da cidade. Havia outras árvores. Mas as que se destacavam de fato eram a figueira e os eucaliptos. Também se destacavam, o “Palmeirinha”, o “Brasil”, o “Star”; times que disputavam não sei bem o quê e o coração dos guararapenses.

Foi indo até que, numa bela manhã de abril, domingão, clima ameno, com os eucaliptos cheirando a mil, vinte e um homens de calção, camiseta e chuteiras, dentro do campo cercado por balaústres, esperavam que aparecesse um vigésimo segundo “jogador”. Já havia uma pequena multidão de “torcedores”. Todo tipo de pessoas: mulheres, homens, meninos, velhos, velhas, rapazes... E o tal do vigésimo segundo teimava em continuar faltando.

De entre aqueles torcedores todos, em pé, parado ao lado de um belo cavalo caprichadamente arreiado, um moço, aparentado 19, 20 anos. Alto, magro, tranquilo... Todo vestido de preto – e de chapéu preto –, esperava o “espetáculo” começar — porque viera para ver.

“Militão”, um “meio-dono” daquela festa, era espirituoso. Outro meio-dono, e barulhento por natureza, era o “Baruiada”, como era apelidado o Geraldo. “Baruiada” estava a meio caminho entre o Militão e o “cowboy”, de sorte que o Militão meio que lhe gritou:

Ô! Baruiada! chama esse “Roquilane” aí, p’ra jogar!

Não deu outra.

Ô! Roquilane! vem jogá co’a gente!

E o rapaz topou completar o time.

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Não sei quantos anos teria o homem, nem lhe sei o nome. Continuava alto, mas já meio envergado pelo tempo, e magro. Não mais usava chapéu nem andava a cavalo... Porém, desde aquela fagueira manhã de abril, como gruda um emplastro, “Roquilane” grudou-lhe por apelido. “É pouca gente que sabe o meu nome”, dissera-me ele.

Foi o Diniz Bressanin, figura conhecida de todos os guararapenses, principalmente de quantos passaram pelo antigo Colégio e Escola Normal Estadual “João Arruda Brasil”, quem me apresentou o Roquilane. Topei com eles na praça Nossa Senhora da Conceição, em fevereiro de 2.013. Completamente brancas as sobrancelhas abastadas e o cabelo, foi o próprio Roquilane, perfeitamente de bem consigo e com o mundo, que me contou essa parte de sua vida... vivida na terra onde nasci...

JOSÉ IZIDRO MANOEL

izidro.jim@hotmail.com