O JUIZ E O SOMBRA

O JUIZ E O SOMBRA

Há alguns anos tive a oportunidade de assumir um cargo comissionado no Tribunal de Justiça. O Desembargador que havia sido eleito Presidente, no intuito de formar uma equipe de trabalho responsável e de sua confiança, convidou a mim e a outras pessoas para compor o quadro.

O que vou lhes contar agora nada tem a ver com o trabalho efetuado no Tribunal, mas, foi um fato engraçado que aconteceu comigo dias antes de assumir o cargo.

Fora marcada a data da cerimônia de posse do novo Presidente do Tribunal de Justiça. A solenidade ocorreria no Centro de Convenções do Estado, no recinto do Teatro Gustavo Leite. Muitas autoridades foram convidadas.

No dia aprazado, como forma de gratidão e de dever funcional fui prestigiar o meu patrono. Logo eu, que sou avesso aos holofotes, embora às vezes faça uso da pena e dos pincéis, para me fazer aparecer!

Não havia outro jeito! Tinha a obrigação de demonstrar meu agradecimento pelo convite, e de dar apoio ao Presidente!

Lá estava eu, todo embecado e cheiroso que nem filho de barbeiro! Me impressionou o número de pessoas presentes. A “Justiça” em peso compareceu! Desembargadores, Juízes, Promotores, Advogados, Defensores Públicos, Servidores, entre outros. Ah, os políticos e a alta sociedade também estavam lá.

Meio sem jeito, fui tomar lugar na fila de acesso à entrada do teatro. Foi nessa hora que começou a minha aventura ! Imediatamente à minha frente estava um senhor baixinho, gordinho, bem vestido, sorridente, que me pareceu bem simpático. Não demorou muito e começaram a vir em nossa direção várias pessoas, uma após outra. Paravam e cumprimentavam aquele senhor distinto, e depois, olhavam para mim e, mesmo sem me conhecerem, cordialmente cumprimentavam-me também!

E assim foram se sucedendo cinco, dez, vinte pessoas. Paravam, cumprimentavam-no efusivamente, e depois a mim também.

Durante os primeiros cumprimentos o festejado convidado não se importou muito comigo, mas depois do quinto ou sexto ele passou a se virar para trás, olhando para cima em minha direção, eu sou bem mais alto. Não sei se ele estava tentando saber quem era aquele “famoso quem”, que estava às suas costas, ou se já estava ficando preocupado que eu fosse mais famoso do que ele!

Olhava para trás com um olhar desconfiado, e eu, todo sem jeito, rezava para que aquela fila enorme andasse logo, e nós tivéssemos acesso ao local da solenidade! Aqueles minutos pareceram uma eternidade! Nem ele perguntou quem eu era, nem eu me atrevi a cumprimenta-lo.

Finalmente adentramos no recinto, e eu tratei logo de ir para bem longe dele!

No término da cerimônia saí de fininho, bem ligeiro, para não correr o risco de ficar próximo de outra autoridade daquela estirpe!

Na semana seguinte tomei posse no meu cargo, e fui muito bem recebido pelos colegas de setor, principalmente pela servidora efetiva que sabia de todo o funcionamento do Tribunal, e humildemente me passou muito do seu conhecimento! Fizemos grande amizade. Sou-lhe muito grato! Messes depois contei-lhe sobre o ocorrido no dia da posse do Presidente, descrevendo o senhor que estava à minha frente. Ela riu para se acabar e me disse que aquele era um Juiz muito querido no Judiciário, e que por muitas vezes ele também era convocado para substituir algum Desembargador que estava de férias ou doente. Eu, como advogado com pouco tempo de profissão, não o conhecia.

Nesse cargo tive contato com alguns desembargadores e juízes, e depois de algum tempo, imaginem quem chegou em minha sala! Ele mesmo, o “famoso da posse”! Não me reconheceu, mas dessa vez eu não perdi a oportunidade e tomei a liberdade de lembrar-lhe daquele episódio. Rimos muito, e foi dessa forma que ele ficou sabendo que aquele “famoso quem” que dividiu com ele os holofotes da cerimônia de posse do Presidente do Tribunal, tratava-se de um “sombra”! Saiu todo pimpão, distribuindo a sua simpatia e cordialidade!