A VANTAGEM DAS ÁRVORES

A VANTAGEM DAS ÁRVORES

(Texto de José Bonifácio e publicado no livro POETA CRÔNICA E VERSO) vale a pena ler...

“Sem matas a umidade necessária para a vida das outras plantas, e dos animais vai faltando... O torrão se fêz árido e nu. Tojo, estêvas, urzes e carquejas apenas vestem mesquinhamente alguns cumes e assomados, algumas gândaras e chãs. Diminuindo os orvalhos e chuveiros, diminuem os cabedais, certos e perenes, dos rios e das fontes; e só borrascas e trovoadas arrasam as ladeiras, areiam os vales e costas, e inundam e subterram as searas. O suão abrasador apodera-se das províncias; e novo clima, e nova ordem de estações estragam campos, outrora férteis e temperados. A eletricidade que então circulava pacificamente da terra para o ar, e do ar para a terra, faz agora saltos e explosões terríveis, invertendo a série e força dos meteoros aquosos, favorecem a vegetação, e com ela tornam sadias as Províncias. E donde vem tantas sezões e febres malignas nos campos abertos e calorosos de Portugal, senão da falta de bosques em paragens próprias, e das águas correntes, que alimentavam? Sem matas, quem absorverá os miasmas dos charcos? Quem espalhará pelo estio a frescura do inverno? Quem chupará dos mares, dos rios, e lagoas os vapores, que em parte decomposto em gases, vão purificar o ar, e alimentar a respiração dos animais? Quem absorverá o gás ácido carbônico, que estes expiram, e soltará outra vez o oxigênio, que aviventam o sangue, e que sustenta a vida?

Sem matas desapareceu a caça, que fartava o rico e o pobre. Sem matas faltaram os estrumes naturais, que subministram diariamente sua folhas e resíduos. Sem elas míngua a fertilidade do torrão; e a lavoura e a povoação definharão necessariamente. Elas sustentam a terra vegetal das ladeiras e assomados, que pela regular filtração das águas adubam os vales e planícies. Em balsedos nas margens dos rios, que extravasam, poem os arvoredos peito às cheias devastadoras, cortando-lhe a força; e coando as águas das areias, fazem depor os nateiros, que fertilizam as lezírias e ínsuas. Se os canais de rega e navegação aviventam o comércio e a lavoura, não pode havê-los sem rios, não pode haver rios sem fontes, não há fontes sem chuvas e orvalhos, não há chuvas e orvalhos sem umidade, e não há umidade sem matas; pois uma árvore de dez anos destila cada dia mais de 30 onças de água, que espalha em redor de si; e um chão desabrigado de 3,5 pés quadrados perde diariamente 30 onças de água. Demais, sem bastante umidade não há prados; sem prados pouco ou nenhuns gados; e sem gados nenhuma agricultura. Assim tudo é ligado na imensa cadeia do Universo; e os bárbaros que cortam e quebram seus fuzis, pecam contra Deus e a Natureza e são os próprios autores dos seus males.”

(Memória sobre a necessidade e utilidade do plantio de novos bosques em Portugal. Lisboa 1815 - José Bonifácio)

Jacó Filho
Enviado por Jacó Filho em 03/11/2007
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