Aromas e sabores do tempo

Domingo de chuva fina e fresquinha...brisa suave me trazendo aromas e sabores do passado.

Me pego com os olhos marejados quando sinto o cheiro do café torrado. O som dos grãos girando dentro do torrador, feito um chocalho tocado no mais perfeito compasso daquelas velhas mãos enrugadas pelo tempo, mas com a firmeza e exatidão do próprio tempo...música que embala minhas lembranças.

Aroma que toma conta de todo um quarteirão, de toda a casa. Enquanto isso, embalada pelo som e pelo aroma, na cozinha pequena e aconchegante, ajudo minha avó a moldar artesanalmente os biscoitos de polvilho. Um a um, sou a única capaz de ajudá-la a contento,exigente e cuidadosa, não abre mão dos costumes. Vários formatos, mas todos do mesmo tamanho, têm que ser perfeitos, como perfeita é a dedicação por aquele momento, por aquele ritual que reúne filhos, netos, e lembranças.

A garganta ameaça o nó, as lágrimas vêm...saudades, mas não dores. Apenas saudades.

Do cheiro do café torrado, do sabor dos biscoitos de polvilho, dos risos de moleca avoada, das mãos lambuzadas de óleo, da vida que o tempo levou.

Sem ressentimentos com o tempo, apenas o desejo de fazê-lo, às vezes, mais lento.