NÃO QUERO TER RAZÃO. RAZÃO E VERDADE.

Não quero ter razão, quero estar ao lado da verdade assemelhada, como no esforço dos votos médios nos tribunais.

Estou relendo, melhor dizendo, refletindo exaustivamente faz dias, e nisso debruçado, pois não se trata de construção para simples leitura, a encíclica de Bento XVI, “Caritas in Veritate”. Assimilação hercúlea.

Poderíamos ao pé da letra traduzirmos como o “amor na caridade” que a vastíssima cultura do intelectual Ratzinger, hoje Papa Emérito, indica como “amor à verdade”.

E essa verdade está na justiça que se alimenta da caridade. Nunca é demais lembrar o silêncio de Cristo, quando seu julgador romano, Pilatos, questionou-o sobre o que era a verdade.

Seu silêncio póstero sinalizava onde residia a vontade que nascia no homem primeiramente para se materializar na justiça, e a justiça, debruçada sobre a verdade, faz a caridade que reconhece a irmandade e dentro das grades das falhas humanas reorganiza o convívio quando cindido.

Não há justiça sem caridade e ambas são geradas pela verdade da criação que fez de todos iguais, desigualados somente em dons, e que não consente desvios para construir a unanimidade do que seja fraterno.

Assim, todos nós desnecessitamos ter razão sobre qualquer coisa, pois tudo que se põe na mesa da crítica é relativo, e alicerça o pensamento que se forja na caminhada experimental. Precisamos sim, sempre e sempre, estarmos ao lado da verdade mínima, a nossa verdade pessoal, estruturada, que não pode, sem culpas, incidir em erro.

A verdade da razão, por vezes é irmã do erro identificado e nos leva à verdade trabalhada pela crítica construtiva.

“A verdade acerca de nós mesmos, da nossa consciência pessoal é-nos primariamente dada; com efeito, em qualquer processo cognoscitivo, a verdade não é produzida por nós, mas sempre encontrada ou, melhor recebida. Tal como o amor “ela não nasce da inteligência e da vontade, mas de certa forma impõe-se ao ser humano”. Caritas in Veritate, fls 59, “Deus Caritas Est”; final em aspas.

Estabeleçam-se as diferenças apontadas, e cada um recolha o que lhe está disponível segundo as margens que nunca levam a uma terceira margem. Ela não existe e poucos percebem. A nossa verdade “é-nos primariamente dada”, é nosso estatuto pessoal, não há como dele se desvincular.

A outra verdade, a verdade que nos chega através do processo de conhecimento, cognoscitivo, é objeto de busca e recepcionado por ser “recebido” conforme acentua o finíssimo intelectual Ratzinger, que fala como Bento XVI, o Primeiro Ministro de Cristo.

Por isso não devemos pretender “ter razão”, mas buscar a verdade, difícil de se avizinhar, sem receios, vaidades ou pretensões descabidas, distantes da ponderação, mergulhados em querer e poder apreender o que seja o mundo e o que se passa com ele em todas suas variantes. Com toda essa ânsia seremos sempre o “sei que nada sei” socrático e destino de pouca colheita.

O vaidoso é o cego que nunca irá enxergar e passará pela vida vivendo de sombras ainda que feliz em sua insciência, mas não verá o sol nem entenderá sua luz. É a disfunção militante. O que se apossa do conhecimento médio e pode ver, vive uma "certa verdade", que transcende.

Como ensina Bento XVI em sua encíclica, monumental no enfoque das dificuldades sociais contemporâneas, “A esperança encoraja a razão e dá-lhe a força para orientar a vontade”, e continua pela doutrina de Santo Agostinho, “Por sua natureza o dom ultrapassa o mérito; a sua regra é a excedência. A verdade que é dom tal como a caridade é maior do que nós como ensina Santo Agostinho”.

Busquemos e respeitemos, portanto, nossa verdade primária que “nos é dada” e, só assim, poderemos alcançar a razão e o patamar máximo da inteligência, a compreensão da verdade exercida pela razão. Sem excessos. Ninguém vai além do que lhe conferiu o destino.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 28/04/2021
Reeditado em 28/04/2021
Código do texto: T7243329
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